Acredite se quiser
O actual Governo começa a parecer-se de mais com uma comissão liquidatária do património do Estado a preços de saldo (e com os contribuintes a financiar os compradores).
A eliminação das "golden shares" a troco de nem um cêntimo não foi outra coisa senão uma escandalosa liberalidade ao capital privado. E não se diga que foi imposição da "troika" pois a "imposição" foi aceite, é bom não esquecê-lo, por PSD, CDS e PS e apesar de Alemanha, França, Reino Unido, Itália, Irlanda, Grécia, Finlândia, Bélgica e Polónia continuarem a manter "golden shares" em empresas estratégicas (provavelmente terão é governos menos servis).
O BPN será, por sua vez, "vendido" ao BIC com o Estado a suportar os encargos dos despedimentos e ter que nele meter ainda mais 550 milhões, além dos 2,4 mil milhões que já lá estão. Tudo por... 40 milhões.
Seguir-se-ão os transportes, as estruturas aeroportuárias, os Correios, a água... O processo será o mesmo dos transportes: primeiro limpam-se os passivos das empresas à custa dos contribuintes (os aumentos "colossais" das tarifas dos transportes públicos dão uma ideia do que está para vir) depois são entregues de bandeja ao capital privado.
Para isso, o Orçamento Rectificativo agora apresentado na AR prevê 12 mil milhões para a banca mais um aumento de 20 para 35 mil milhões em garantias. Assim não faltarão à banca dinheiro nem garantias do Estado para ir aos saldos do Estado.
(ARTIGO DE MANUEL ANTÓNIO PINA)
JN de hoje, dia 3 de Agosto
Não vou ter de nascer duas vezes
Experiências com ratos demonstram que é possível estar acordado e ter o cérebro parcialmente a dormir. Essa é a explicação mais bondosa para o facto de o governador do Banco de Portugal ter demorado sete anos a perceber que algo de muito errado e ilegal se passava no BPN.
Podem aventar-se outras explicações para o facto de Vítor Constâncio ter ignorado as reservas que os auditores da Deloitte levantavam às contas do banco e os alertas constantes do trabalho publicado em 2001 na capa da "Exame", denunciando irregularidades e levantando bem fundamentadas dúvidas sobre a gestão de Oliveira e Costa.
Falar na desadequada graduação das lentes dos óculos de Constâncio pode ser uma piada de gosto duvidoso. Considerar que se tratou de uma letal combinação de negligência e incompetência é uma hipótese mais plausível, mas também muito dolorosa, pois ele não só não está arrolado como cúmplice involuntário desta gigantesca burla como, ainda por cima, acabou recompensado com uma vice-presidência do Banco Central Europeu.
Enquanto Portugal dormia sossegado, na doce ignorância, uma data de gente conhecida arruinava o BPN, como está documentado nos 70 volumes e 700 apensos que constituem o processo legal de uma catástrofe financeira, que apesar de ainda não ter conhecido o seu epílogo já nos custou, grosso modo, o equivalente a um 13.º mês para todos os contribuintes.
Da longa lista dos beneficiários da catástrofe consta o clássico Vale e Azevedo, que urdiu um ardiloso esquema para sacar dois milhões de euros ao BPN.
Dias Loureiro não poderá devolver um dólar sequer dos 71 milhões USD que gastou a comprar duas tecnológicas em Porto Rico (que faliram logo de seguida...) porque não tem nada em seu nome, nem mesmo o famoso taco de golfe que mandou fazer no Japão e ele garante ser o melhor do Mundo.
Duarte Lima, outro nome do Gotha cavaquista, comprou uma off-shore ao BPN e sacou um empréstimo de dois milhões de euros ao Insular, o banco fantasma de Cabo Verde do grupo.
Cavaco e a sua filha Patrícia lucraram, em menos de dois anos, 375 mil euros (mais ou menos o que ganha numa vida um português médio), num negócio com acções da SLN (a holding que controlava o BPN), vertiginosamente valorizadas em 140%.
Tenho a certeza de que Cavaco e Vale e Azevedo não são madeira da mesma árvore. Sei que o PR deve estar arrependido da amizade e protecção que deu a Dias Loureiro e Duarte Lima. E acredito que se soubesse o que sabe hoje não aceitaria o negócio de favor que lhe foi proporcionado pelo seu ex-secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.
Mas estamos a viver aqueles tempos em que "já não é possível dizer mais, mas também não é possível ficar calado" (cito Manuel António Pina). Por isso declaro que não sinto a necessidade de nascer duas vezes para ser tão honesto como Cavaco.
(ARTIGO DE JORGE FIEL)
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