PORTUGAL-BELMONTE-MUSEU JUDAICO
Língua extinta da Península Ibérica. No passado, quando havia grandes comunidades judaicas nas cidades de Portugal e de Espanha, foi a língua usada pelos judeus desses países: uma mistura de palavras hebraicas de seu dia a dia com a língua da região onde habitavam, que podia ser o castelhano, o português, o árabe ou até mesmo o catalão. Não era um idioma muito diferente do falar de seus vizinhos cristãos ou muçulmanos.
A língua judeu-espanhola se desenvolveu por vários séculos separada por completo da mãe pátria (Sefarad, Península Ibérica), com a qual não conservou mais que escassos e esporádicos contatos. Foi a língua dos judeus sefarditas nas cidades da Europa oriental (na Bósnia, Sérvia, Macedônia, Grécia, Bulgária, Romênia e Turquia) onde viviam alguns milhares, descendentes dos judeus espanhóis expulsos da Espanha em 1492, e de Portugal logo depois, que encontraram asilo no Império Turco. Contudo, a maioria desses judeus era mesmo procedente de terras de Espanha.
Estes judeus (muitos morreram durante a Segunda Guerra Mundial, como conseqüência das perseguições nazistas), tem conservado até hoje sua língua, que a despeito das múltiplas inovações devido sobretudo à forte influência dos povos junto aos quais habitaram, corresponde admiravelmente ao espanhol do período clássico (como a conservação da letra f, da distinção entre a s surda e sonora e entre a z surda e sonora, e a conservação do valor sh para x e j).
O judeu-espanhol, especialmente o usado nos livros religiosos, é conhecido também como ladino, significando o verbo enladinar “traduzir ao espanhol” (especialmente textos hebreus e árabes). O fato de que no Cantar del Cid se fale um mouro latinizado mostra que naquele tempo ladino queria dizer espanhol, em oposição ao árabe e a outras línguas estrangeiras. Restam seqüelas disto, assim mesmo, nos vários sentidos especiais assumidos pela palavra ‘’ladino’’ nas Américas Central e do Sul.
Uma das grandes obras dos judeus sefarditas foi a tradução do Antigo Testamento conhecida como Bíblia de Ferrara, editada por Jerónimo de Vargas e Duarte Pinel, espanhol e português respectivamente, em 1553 na cidade italiana de Ferrara.
Após a Segunda Guerra Mundial os emigrantes sefarditas se instalaram em Israel, nos Estados Unidos (sobretudo em Nova York e Los Angeles) e na América espanhola (Buenos Aires, Cidade do México, Caracas, San Juan etc.), enquanto um pequeno número iniciou seu retorno à Espanha. Alguns poucos foram para o Brasil, especialmente para Belém do Pará (marroquinos). Actualmente, o judeu-espanhol é utilizado unicamente pelos velhos nas comunidades sefarditas, não sendo transmitida às novas gerações. Muitos judeus sefarditas têm o ladino como sua língua materna (Yasmin Levy é um exemplo) porém seu uso se restringiu à infância, mais ou menos como é o caso do iídiche. Parece, então, provável que desapareça por completo no decorrer de algumas décadas, especialmente na Diáspora. Há já lugares em que os falantes de ladino não passam de umas poucas dezenas, como em Salónica ou em Belgrado, todos eles já bastante idosos.
Até o século XIX, se seguiu a inviolável tradição de se escrever o judeu-espanhol com um tipo de alfabeto hebreu (caracteres rashi), mas, a partir desta data, começou-se a incorporar à escrita o alfabeto latino, fazendo uso dos princípios de correspondência som-letra baseados na prática ortográfica francesa. Logo no início do século XX, manteve-se a publicação em judeu-espanhol de livros, revistas e jornais, mas na atualidade esta tradição já desapareceu quase por completo. Abaixo uma canção medieval judeu-espanhola:
"Avre este abajur, biju
avre la tu ventana
por ver tu kara morena
al Dió daré mi alma.
Por la puerta io pasi
y la topi cerrada;
la iavedura yo besi
como besar tu cara.
No quiero más que me avlesh
ni por mi puerta pasesh;
más antes me keríash bien
angora te ielatesh.
Si tú de mí te olvidarásh,
tu ermozura piedrarásh.
Ningún ninyo te endenyará
en los mis brazos muerash."
Nota-se na mesma a característica alusão sefardita à divindade, Dió em lugar de Dios, como uma forma gramaticalmente enfática, ainda que ingênua, de atribuir a unicidade absoluta a Deus.
O judeu-espanhol conservou partes próprias do espanhol medieval final, onde se inclui elementos de pronúncia e vocabulário que na Espanha se perderam ou se modificaram; por outro lado, introduziu novas características fonéticas e, sobretudo, novas entradas no léxico, que de nenhum modo encontraram caminho de volta à Península Ibérica.
Entre estas inovações pode-se assinalar um alto número de préstimos procedentes das línguas que o judeu-espanhol entrou em contato, sobretudo do grego e do turco, ainda que também de outras línguas balcânicas (búlgaro, romeno, servo-croata etc) e do árabe, especialmente do dialecto de Marrocos (o ladino falado ali, singular e visivelmente diferente dos outros ladinos, é conhecido como hakitía, ou ladino ocidental).
Sem comentários:
Enviar um comentário