Os portugueses estão habituados a ser enganados por dirigentes políticos, assim como estão habituados a candidatos trânsfugas, paraquedistas, troca-tintas, camaleões, falsos independentes e oportunistas de vários tipos. Mas nunca ninguém foi tão rápido a trair os seus eleitores e a dar o dito por não dito como Fernando Nobre, o médico que se apresentou nas presidenciais como "o candidato da cidadania" Aquele que há pouco mais de dois meses se exibia nos comícios como única alternativa aos "candidatos do sistema", e que quase se ofendia quando lhe perguntavam se aceitaria cargos de nomeação partidária, vai aparecer agora como de lista do PSD por Lisboa e virtual candidato a presidenta da Assembleia da República.
Possivelmente, Passos Coelho acredita que Nobre lhe vai trazer os votos que obteve na presidenciais. Ora, é fácil perceber que só irão - se forem - para a lista social-democrata os votos dos eleitores acidentais de Nobre que se zangaram com Cavaco, mas que já foram eleitores do PSD. Todos os outros regressarão, como se percebe pela indignação geral com que a notícia foi recebida, ou à abstenção militante ou aos partidos a que pertenciam. Passos fez um péssimo negócio porque o seu candidato maravilha se desvalorizou completamente no próprio acto em que se entregou às delícias da política partidária que dizia abominar.
Este episódio não acrescenta nobreza à política nacional e torna-se ainda mais chocante por ter como protagonista quem menos se esperaria. Dir-se-á que é apenas a opção de um indivíduo. Mas os regimes políticos desacreditam-se e desmoronam-se exactamente por causa dos comportamentos dos indivíduos que os servem, ou que deles se servem. Para a pequena hostória da democraciac portuguesa, esta doi uma semana em que a obsessão da caça ao voto se conjugou com a obsessão da caça ao tacho.
(Texto de Fernando Madrinha, jornalista, publicado no Expresso de 16-4-2011)
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