FMI: Reformas e cortes de salários não chegam para Portugal crescer
Por Bruno Faria Lopes, publicado em 20 Jun 2012 -
Técnicos avisam que sem acção imediata o efeito das reformas estruturais pode ser anulado pelo ambiente recessivo. Corte na TSU volta a ser recomendado
A estratégia de desvalorização interna de salários e de preços defendida pelo governo e pela Comissão Europeia não é suficiente para restaurar a competitividade externa de um país periférico da zona euro como Portugal, avisa uma equipa de técnicos do Fundo Monetário Internacional (FMI) num relatório publicado esta semana. Os especialistas avisam ainda que as reformas estruturais – nas quais, a par da desvalorização interna, o governo e a troika depositam esperanças para relançar o crescimento da economia – levarão anos a ter efeito e que num ambiente fortemente recessivo, como o português, podem mesmo não funcionar.
“Embora haja prova substancial dos benefícios a longo prazo, os ganhos imediatos com as reformas não estão totalmente percebidos e é pouco provável que sejam muito grandes”, aponta o estudo “Fostering Growth in Europe now” [Promover o Crescimento na Europa agora]. “Uma das ameaças claras é que num ambiente de fraca procura agregada, as medidas e reformas do lado da oferta falhem na impulsão da economia, deixando parte da Europa num período de estagnação prolongada”, acrescenta o texto assinado por três economistas do FMI.
O documento publicado segunda-feira à noite pelo Fundo confirma uma cisão nas visões dos membros da troika para as economias do Sul da Europa, como Portugal. A Comissão Europeia, o Banco Central Europeu (e o governo) põem o foco na austeridade, na desvalorização interna (corte de salários e preços para compensar a impossibilidade de uma desvalorização cambial) e no efeito a prazo de reformas estruturais, como a flexibilização das leis do trabalho ou os cortes nas rendas excessivas de sectores como a energia.
O FMI defende o valor das reformas estruturais – citando estudos que dão conta de efeitos anuais superiores a 1,7% do PIB –, mas avisa que estas podem levar a um efeito recessivo a curto prazo, somado ao das medidas de austeridade. “Baseados num estudo empírico percebemos que o desemprego pode subir temporariamente depois de implementadas as reformas do mercado de trabalho”, lê-se no documento, que noutra passagem refere “custos sociais potencialmente altos”.
O ambiente recessivo criado – queda da actividade, desemprego alto, flutuações cíclicas – tem por sua vez potencial para comprometer o início e a amplitude do efeito positivo das reformas estruturais, abrindo a porta a uma estagnação prolongada, que desgasta o apoio social e político à consolidação orçamental e às reformas mais duras.
Os técnicos do FMI insistem que o mais importante a curto prazo é “impulsionar o crescimento do produto” e da procura, aumentando ainda a empregabilidade (voltando, para isso, a mexer nas leis laborais – ver texto ao lado). A receita da troika assenta em primeiro lugar na desvalorização salarial e de preços – para aumentar a competitividade das exportações –, mas a análise do Fundo mostra as dúvidas sobre o impacto isolado deste rumo.
“São precisos vários factores para uma desvalorização interna fechar o fosso de competitividade, a maior parte dos quais não está presente nos países do Sul na zona euro”, realça o estudo do FMI, citando a falta de flexibilidade dos mercados (laboral e de produto) e a ausência de margem para usar a política orçamental como almofada de suavização do choque social causado pelo choque das reformas.
O Fundo propõe várias almofadas temporárias para reavivar a economia. A primeira recupera a medida originalmente proposta no início do programa português, mal-amada pela Comissão Europeia (devido ao risco para a meta do défice) e rejeitada pelo governo de Passos Coelho: o corte nas contribuições sociais suportadas pelos empregadores (taxa social única, ou TSU), compensado por uma subida do IVA. O documento refere especificamente o exemplo português, com um impacto entre 0,2% e 0,6% nas exportações decorrente de um corte na TSU equivalente a 1% do PIB.
Alemanha tem de gastar mais.
Além das medidas a tomar em Lisboa – que não anulam a necessidade de corrigir as contas públicas –, os economistas do FMI avisam a Europa de que o esforço do ajustamento de países como Portugal poderia ser muito facilitado por uma política expansionista no Norte da Europa.
“O crescimento a curto prazo precisa de uma procura (idealmente privada) interna mais robusta no Norte e procura externa mais firme no Sul”, aponta o estudo. “Norte” significa sobretudo Alemanha, a maior economia da zona euro, onde o caminho expansionista não tem muitos adeptos, apesar dos sinais recentes de subidas mais amplas dos salários e de maior tolerância na inflação. “Não são sinais de uma mudança na política alemã, mas das condições actuais de baixo desemprego”, diz ao i Torsten Schmidt, investigador do think tank alemão RWI, em Colónia.
“O crescimento a curto prazo precisa de uma procura (idealmente privada) interna mais robusta no Norte e procura externa mais firme no Sul”, aponta o estudo. “Norte” significa sobretudo Alemanha, a maior economia da zona euro, onde o caminho expansionista não tem muitos adeptos, apesar dos sinais recentes de subidas mais amplas dos salários e de maior tolerância na inflação. “Não são sinais de uma mudança na política alemã, mas das condições actuais de baixo desemprego”, diz ao i Torsten Schmidt, investigador do think tank alemão RWI, em Colónia.
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