Portugal e a Tailândia têm uma relação impar nos anais históricos euro-asiáticos. Uma aliança frutífera para ambas as nações e um relacionamento de amizade de cinco séculos, que fizeram perdurar, até aos nossos dias, um legado vivo de memórias, afectos e tradições, expressos em domínios tão diversos como vocabulário, a culinária, o património arquitectónico ou ainda nas famílias tailandesas de origem lusa.
A Língua de Camões na Tailândia, Oriente e Índias Orientais
A Língua Portuguesa nos dias que correm é o meio de comunicação de cerca de 300 milhões de pessoas. E, consequentemente a ofícial nas instituições governamentais, do ensino nos países que os portugueses povoaram; colonizaram a partir do século XV e de quando se deu o início da expansão de Portugal no Mundo.
Expandiu-se progressivamente pelas costas ocidental e oriental de África, Índia, Costa do Coramandel, Ceilão, Reino do Pegú, Ilhas de Samatra, Molucas, Timor, Sudeste Asiático, China até ao Japão.
Portugal, país de reduzida dimensão geográfica, fundado em Guimarães por D. Afonso Henriques em 1228, estendeu-se até ao sul. Banhado a costa pelo Oceano Atlântico o privilegiou de ser a varanda da Europa. A grei composta de homens rudes e de almas generosas, nela surge um português ilustre: o Infante D. Henrique. Fundou a escola náutica de Sagres que o coloca, sem par ou contestação, numa figura humana de grande dimensão que transformou, completamente, o mundo, a partir do século XVI, graças à sua persitência.
O sonho do Infante foi concretizado após a sua morte: as Caravelas de Cristo já navegam em todos os aceanos da terra. Mercadores, missionários, do Padroado Português do Oriente, conforme os mareantes lusos largam as âncoras das caravelas nas baías e enseadas nas costas das novas terras descobertas, a civilização lusa, juntamente com a fé cristã, ficou e criou raízes.
Com isto, a língua de Camões, viria por mais de quatro séculos o meio de comunicação entre os países da Ásia, para o comércio, tratados entre países, relações bilaterais, missionarismo de crenças existentes na Europa, a religião católica e, em meados do século VII, o protestantismo.A língua portuguesa no final do século XVI é falada desde a Madeira, arquipélago descoberto em 1418, até ao remoto Japão. Os portugueses durante quase um século estão sós e senhores absolutos do comércio do Oriente. Foi num espaço de 100 anos que milhares de pessoas aprenderam a falar o português e foram assimilando frases de língua lusa às de suas raizes.
Em todos os portos da Ásia, onde os mercados e a comunidade luso-descendente se situam, a língua portuguesa ali está a servir de meio de ligação entre a França, Inglaterra e a Holanda, quando estes países começaram a descobrir o "filão" das riquezas do Oriente.
Era assim a importância da língua portuguesa em todo o continente asiático: S. Francisco de Xavier, o Apóstulo das Índias, ao serviço da coroa portuguesa, em 1545 pede a Lisboa que lhe mandem missionários a falar a língua portuguesa. A Holanda e o Bantão (Indonésia), em 1596 assinam o primeiro Tratado de Paz e Comércio, cujo texto é redigido na língua portuguesa. Dois anos depois, Maurício de Nassau, regente dos Países Baixos foi portador de uma Credencial que o acreditava como representante deste país.
Ainda neste mesmo ano (1598), os holandeses colocam uma inscrição pseudo-portuguesa na Ilha Maurícia. Um inglês, comerciante, em 1600 é chamado perante um Rei do Japão e foi na língua portugesa que se exprimiu ao monarca. Os barcos ao serviço dos holandeses, nas viagens para o Oriente, levam intérpretes que falavam o português. Frei Gaspar de S. Bernardino, em 1606, encontra no interior da Pérsia pessoas que falam o português.
Mergui (Birmânia), onde viveu uma numerosa comunidade portuguesa e porto de grande movimento marítimo, a língua lusa era a corrente entre a população local e transitária. É assim a língua portuguesa o único meio de comunicação entre os povos da Ásia e o mundo ocidental. Ainda, em 1915, os missionários holandeses tinha por obrigação de ter conhecimento global do português nos territórios sob a tutela da Companhia das Índias Orientais.
Voltando ao início da introdução e depois de um século da língua portuguesa já estar firmada e enraizada por todos os países da Ásia, não pode ficar ignorado um estudo do Prof. David Lopes sobre a expansão da língua lusa na Ásia:
"(1609). As autoridades de Urtan (filha de Puloway, Samatra) mandaram a Keeling, mercador inglês que falava português, uma carta do almirante holandês em língua portuguesa. Muitos habitantes da ilha de Mohélia (uma das ilhas Comores) falavam português. (1620) Tratado de Paz e Comércio entre os dinamarqueses e o Princípe de Tanjor em espanhol-português e alemão. (1638). Os moradores de Comores, em frente de Ormuz, falavam português. (1639-1687). Em Batávia, as mulheres da sociedade e os escravos falavam português, segundo N. de Graaf. (1646-1656). Os reis de Ceilão correspondiam-se em português com os holandeses. (1647).
O Governador da Ilha Célebes falava bem português, segundo o P. Alexandre Rhodes. (1661). A língua portuguesa é falada por quase todos os habitantes da Índia, segundo Schouten. (1675). Pregação em língua portuguesa na cidade de Batávia. (1679-1681). Os Reis de Arcão correspondiam-se em português com o Governador-geral da Batávia. (1686). Os jesuitas franceses que iam para a China falavam português - "que era a língua mais concorrente no país" - com o Governador da Batávia, segundo o P. Tachard. (1669). Em Sião, os padres franceses pregavam em português, segundo o P. Tachard. (1698-1704). A Companhia Inglesa das Índias obrigava os ministros da religião a aprender o português. (1708). O português, língua corrente em Batávia, segundo Valentyn. (1708). Os pastores de língua malaia, em Batávia, apresentaram ao Governador-Geral e ao Conselho das Índias pedindo que o culto em língua malaia se fizesse na igreja portuguesa. (1709). Grunder, missionário de Trangambar, afirma a grande utilidade da língua portuguesa, para exercício do seu ministério. (1711). A língua portuguesa é uma espécie de língua franca em todos os portos da Índia, segundo Lockyer. (1718). Na história da princesa Bilibamba, o heroi príncipe chinês, fala português, segundo Biervillas. (1723). Indígenas das Ilha Nicobar que compreendiam o português. (1724 ou um pouco antes). A língua portuguesa é de uso corrente entre os europeus da Índia, segundo Hamilton"....(1)
A Inglaterra e a Holanda procuram por todos os meios e preço tomar o lugar aos portugueses na dominação co comércio do Oriente. Os ingleses preferem a Índia, enquanto os holandeses se estendem mais ao sul, navegando nas águas do mar de Andaman, passando o estreito de Malaca, conquista esta praça aos portugueses fixando-se em Samatra, Batávia e em todas as ilhas do arquipélago que nos dias de hoje são pertença da Indonésia.
A Dinamarca, com presen;a pouco significativa na Ásia, vai fazendo comércio e ocupam alguns portos da Costa do Coramandel, que não são mais que pontos de apoio logístico à sua navegação. A França deseja seguir as duas potências, europeias, e balançar esta força, já a dominar o comércio asiático, sem pretender envolver-se em lutas. O território asiático é enorme e ali há muito que comprar e vender.
Luis XIV o Grande, entronizado Rei de França, na idade do "beberão", aos cinco anos. Um Rei de tenra idade e influenciado pelos educadores da corte, fazem dele um monarca déspota, amante de batalhas e pelas lutas em que a França se envolveu, leva a nação a sofrer o revés da miséria. Luis XIV aspira colonizar o reino do Sião e com o propósito de a França ser o pêndulo da balança que pesavam as forças inglesas na Índia e as holandesas nas Índias Orientais.
São os missionários. jesuítas, das Missões Estrangeiras de Paris encarregadas de fazer a exploração da costa marítima do Sião; referenciar os pontos estratégicos em modos de espionagem, a coberto da religião católica e transmitirem-nos ao Rei Grande. Tal nunca viria acontecer dado que o povo siamês deu conta da conspiração; dá-se um terrível "massacre" e com isto a morte de missionários franceses já residentes em Ayuthaya (Aiutaá). Os que escaparam, são presos e outros metidos em embarcações, subiram o Rio Mekong e fixaram-se em Phnom Penh no Cambodja, mais adiante no Vietname e Laos que pouco depois passam a colonizar estes países.
A língua portuguesa não pode ser ignorada pelas três potências europeias da época. Sabem os seus governantes que dela se terá de servir a sua gente como meio de comunicação, entre os povos das novas terras ocupadas. Os novos ocupantes da Índia, Ceilão, Pegú, Malaca e a Indonésia, não seria com facilidade que poderiam assimilar as suas línguas às dezenas de línguas e dialetos falados no Oriente.
O português já estava a ser falado em termos correctos nos portos da Ásia e nos crioulos simplificados - indo-português e malaio-português - o usado nas trocas comerciais. São os franceses os que mais usam a língua portuguesa em toda a Ásia e, aconteceu no Reino do Sião, capital Ayuthaya, onde a língua portuguesa se tinha desenvolvido, enormemente, entre a comunidade luso-descendentes, no Ban Portuguete (Aldeia dos Portugueses), com uma população a rondar as três mil pessoas.
Na outra margem do rio Chao Prya (Chao Praiá) ou Mename, onde a comunidade portuguesa vive, situa-se o Campo Japonês, cuja população é composta pelos cristão perseguidos em Tenagashima e Negasaki pelo Imperador nipónico e seus samurais. Perseguidos que preferiram fugir do Japão que renegar a fé católica que Francisco Xavier tinha introduzido no país do sol nascente havia mais de um século e instalam-se junto à comunidade portuguesa onde o calor espiritual da religião católica os aconchegava.
Com os avôs, cristãos perseguidos, vive uma ilustre senhora, nascida no Campo Japonês e ficado orfão, a lusa-descendente Maria Guiomar. Senhora virtuosa e possuidora de generosidade que mais tarde viria a contrair matrimónio com o grego Constantino Falcão. Homem expedito e inteligente chegou a ocupar o lugar de primeiro-ministro na Corte do Rei Narai.
Os franceses servem-se de Falcão como intermediário entre eles e o Rei Narai. Os missionários encarregam-se de o converter à religião católica para que possa contrair matrimónio com Maria de Guiomar. O Falcão falava e escrevia correctamente o português. O Museu de Versalhes, em Paris, conserva nas suas gavetas numerosa correspondência, escrita na língua portuguesa, sobre tratados e outra referentes a negócios entre França e o Sião.
Porém, a grandeza da língua de Camões caiu no Oriente... igualmente aos impérios!
A língua portuguesa está a extinguir-se no Oriente. Desde o Norte de Moçambique e confortando a costa da Índia até ao Japão, apenas se fala (não em toda a população) em Goa, Timor e Macau. Nestes dois, últimos, territórios ficou como a oficial.
Até quando?
José Martins
(1) David Lopes, Antologia da Historiografia Portuguesa II - De Herculano aos Nossos Dias, página 138 - Publicações Europa-América.
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