segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

HÁ UM PAÍS ONDE A LEI NÃO É IGUAL PARA TODOS



Texto de Joaquim Vieira lido na Antena 1

Há um país onde a lei diz que todos são iguais, mas onde há uns
menos iguais do que os outros. Estes ajudaram a erguer o país,
e muitos até foram à guerra em nome desse mesmo país.
Mas agora são gente pacífica, de físico debilitado e cujas vozes não
chegam ao céu.
Não ameaçam ninguém, não paralisam o trabalho e já não cumprem os padrões de 
produtividade exigidos.Adoecem mais do que os outros, e são considerados um 
fardo para a sociedade pelo que custam em tratamentos.Não trabalham 
para pagar o que gastam, embora já antes tivessem trabalhado para pagar o
que recebem.O poder político desse país entende que vivem acima das suas
possibilidades e que por isso são uma dor de cabeça.Acha mesmo que seria
mais fácil governar se eles não existissem.
Conclui assim pela sua inutilidade, que estão a mais, que são descartáveis.
Não se importa de lhes dificultar o acesso à saúde, porque é indiferente que morram mais cedo.
Talvez seja até preferível, porque morrendo mais cedo ajudam a 
melhorar o exercício orçamental.
Sendo alvos fáceis e dóceis, sem capacidade contestatária e sem 
instrumentos de pressão, nada custa retirar-lhes direitos e regalias antes julgados vitalícios.
Sendo solidários e ajudando os familiares mais carenciados, não recebem em troca 
a solidariedade dos poderes públicos.
Pelo contrário, são os primeiros na linha de fogo, e quando o poder sente
alguma aflição financeira é a eles, e muitas vezes só a eles, que começa por 
retirar as verbas necessárias.
Mesmo que a suprema autoridade judicial se interponha, declarando ilegal tal
prática, os governantes não se sentem na obrigação de acatar a restrição, 
antes a contornam e insistem no mesmo.
E insistem retirando-lhes ainda mais verbas, e retirando a 
mais vítimas do que antes tinham feito.
Não dizem que aumentam o confisco, mas que estão a recalibrar. 
Dizem também que não é um imposto, quando tem toda a forma de 
um imposto – e um imposto agravado.
Um imposto que se aplica apenas ao tal grupo, e não a todos os contribuintes do país.
Esse grupo são os velhos, e o país, onde não há lugar para velhos, chama-se Portugal.
É um país descalibrado, onde manda muita gente sem calibre.



 
Joaquim Vieira (texto lido na Antena 1)
 
Joaquim Vieira nasceu em Leiria, em 1951.
Jornalista, ensaísta e documentarista, foi membro da direção de vários órgãos de informação (Expresso, RTP, Grande Reportagem).
Assinou a série em 10 volumes Portugal Século XX - Crónica em Imagens e dirigiu uma coleção de 18 fotobiografias (de que escreveu os volumes sobre Salazar, Marcelo Caetano, Almada Negreiros e Benoliel) e Crónica de Ouro do Futebol Português (cinco volumes) e ainda A Nossa Telefonia - 75 anos de Rádio Pública em Portugal.
Coautor de Mataram o Rei! - O Regicídio na Imprensa Internacional, República em Portugal!
O 5 de Outubro visto pela Imprensa Internacional e Os Meus 35 Anos com Salazar, escreveu Jornalismo Contemporâneo - Os Media entre a Era Gutenberg e o Paradigma Digital, Mocidade Portuguesa - Homens para um Estado Novo, A Governanta e Só um Milagre nos Salva.
Os seus mais recentes documentários intitularam-se Maior que o Pensamento e Os Mitos da República.
 

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