sexta-feira, 19 de julho de 2013

E AGORA? O REGRESSO DE PEDRO.

O regresso de Pedro

19/07/13 00:35 | António Costa
IN ECONÓMICO
 
 

As cartas estão marcadas e, agora, só uma reviravolta poderá evitar o que é verdade hoje, à hora a que estiver a ler este texto: não há acordo de salvação nacional, a austeridade e o crescimento não se encontraram e o Presidente da República vai ter de ‘aprovar' o novo Governo de Pedro Passos Coelho e Paulo Portas ou mandar o país para eleições antecipadas.


As cartas estão marcadas e, agora, só uma reviravolta poderá evitar o que é verdade hoje, à hora a que estiver a ler este texto: não há acordo de salvação nacional, a austeridade e o crescimento não se encontraram e o Presidente da República vai ter de ‘aprovar' o novo Governo de Pedro Passos Coelho e Paulo Portas ou mandar o país para eleições antecipadas.

A crise ainda não acabou, e em política tudo é possível, mesmo quando parece impossível, como parece ser a possibilidade de um compromisso entre o PSD e o PS - o CDS, aqui, está literalmente ao centro, como um dia disse Freitas do Amaral - desde que o Presidente da República entendeu dar um raspanete aos partidos, classificá-los de irresponsáveis e transformar-se no personagem central da vida política portuguesa.

A primeira consequência desta crise é verdadeiramente uma ironia: o país está em crise económica e social profunda, o plano de ajustamento com a ‘troika' teria sempre consequências, mas esgotou-se e não foi renegociado por responsabilidade directa do Governo e é por causa de uma crise interna à coligação que Cavaco Silva decidiu abrir um novo ciclo político no país.
Apesar disto tudo, a primeira vítima deste processo é António José Seguro, que já perdeu. Porquê? Porque não controlou o processo, deixou-se controlar por ele, porque entrou em contradição entre as negociações e o voto favorável à moção de censura. Porque já não tem margem para dizer ‘não' a históricos do passado e a históricos mais recentes, como Soares e Sócrates.

Os históricos do PS - curiosamente os dois que tiveram de chamar o FMI para salvar o país da bancarrota - acreditam mesmo que é a flexibilidade da ‘troika' que garante um acordo? Que não há uma restrição financeira activa que obriga a outra política, que dependemos de terceiros, dos nossos credores e da sua avaliação da nossa capacidade de pagar a dívida? Ou será, precisamente, ao contrário, só um acordo poderá garantir uma margem de manobra - a possível para quem ainda não deu um passo na reforma do Estado - para rever as condições do ajustamento?

António José Seguro só poderia ter entrado neste processo se estivesse de facto convencido da necessidade de um acordo substantivo e com conteúdo. Se não queria aceitar cortes de despesa, e compromissos, cuja necessidade é evidente, em torno destes objectivos, deveria ter clarificado a sua posição. Ao não fazê-lo, ao seguir o exemplo de Cavaco Silva, ao preferir uma não-decisão, acabou encurralado.


Cavaco Silva, esse, já começou a introduzir nuances no discurso, a preparar o que não quis antecipar ontem, a partir das Ilhas Selvagens. Mas é melhor começar já a escrever o discurso de explicação aos portugueses, um que se perceba à primeira, que dispense ‘cavacólogos' a saltar de televisão em televisão. Um discurso que explique porque é que decidiu seguir pelo caminho mais longo, e com custos eventualmente irreparáveis, em vez do caminho mais simples, porventura o mais difícil porque exigiria a assumpção de responsabilidades no imediato e não a culpabilização de terceiros mais tarde.

A terceira consequência é um novo fôlego de Pedro Passos Coelho, quase que em resposta à carta de Vítor Gaspar, às críticas implícitas de falta de liderança. O primeiro-ministro revelou-se e ganhou perante o país, nos últimos 19 dias, uma capacidade política perdida, reforçada ainda por cima quando, ao lado, tem um líder do CDS que esteve na origem da crise e um líder do PS estilhaçado.

O primeiro-ministro tornou (mais) verdadeira a ideia de que uma crise é uma oportunidade. Nem tudo está pior, e é evidente que o simples facto de um país, ou uma empresa, ou uma família deixarem de poder viver a crédito teria sempre consequências. Poderia e deveria ter menos, porque, como Vítor Gaspar confessou, de forma cândida, a reforma do Estado, o mais importante, ficou para o fim. A partir deste momento, Passos tem outra legitimidade, até perante Cavaco Silva, para governar, nas suas condições e nos seus termos, até ao fim da presente legislatura.
Pedro Passos Coelho passa uma imagem de homem de Estado, contra tudo e contra todos, aguentou a pressão, e soube decidir bem no momento certo. Até com a autoridade de comprometer Paulo Portas, que estava com um pé dentro e outro fora do Governo. Voltou a falar como primeiro-ministro na plenitude das suas funções, ontem, na Assembleia da República, e abriu definitivamente a segunda fase do ciclo político deste Governo. E vai aproveitar, e bem, essa legitimidade reforçada para obrigar Cavaco Silva a aceitar a remodelação que já apresentou, ou a assumir a responsabilidade de marcar eleições antecipadas, com as consequências que o próprio tão bem identificou.


 

Sem comentários: