João Caupers
Um caso sórdido ao gosto de uma informação reles
Destaque: Que raio se ensina nos cursos de comunicação e de jornalismo?
Não se lhe conhecia qualquer actividade social, intelectual, científica, artística ou política meritória ou, sequer, relevante. Era um personagem medíocre, de cujo perfil apenas pude recolher dois traços, que alguma comunicação social considerou merecedores de referência: era homossexual e era "cronista social".
O primeiro traço deveria ser completamente irrelevante, já que emerge da liberdade de orientação sexual, que apenas a cada um diz respeito. Todavia, considerada alguma prosa que a ocasião suscitou, terá tornado a vítima mais digna de dó – vá-se lá saber porquê!
O segundo, considero-o pouco menos que desprezível: significa que a criatura “ganhava” a “vida” a escrevinhar coscuvilhices e a debitar maledicências, chafurdando nos dejectos dos socialites.
A viagem que o levou a Nova Iorque tinha um óbvio móbil “romântico”, que a comunicação social preferiu apenas insinuar, não por pudor, mas porque a insinuação vende melhor do que a afirmação: tratava-se, simplesmente, de seduzir um jovem de 21 anos.
Quanto a este, também os seus motivos parecem evidentes: “pendurou-se” no idoso para, explorando as suas “inclinações”, beneficiar dos seus supostos contactos internacionais, iniciando uma carreira no mundo da moda.
Estavam, pois, bem um para o outro.
Nada me interessam os pormenores abjectos que rodearam o assassinato. Deixo-os aos media, lambendo os beiços com a sordidez da história, muito melhor do que o criador de qualquer reality show poderia inventar.
O que não posso deixar de lastimar é a falta de vergonha da nossa comunicação social, com destaque para as televisões: há uma semana que os noticiários das 8 abrem com dez ou quinze minutos da "tragédia". Não as imagens horríveis das cheias no Brasil – que ficaram sempre para depois – mas as imagens ridículas dos correspondentes em Nova Iorque, repetindo à exaustão o detalhe dos testículos cortados e a agressão com um televisor (?) – que deve ser um crime especialmente hediondo, aos olhos de quem trabalha para uma cadeia de televisão – e entrevistando em prime time advogados de sotaque extravagante e peritos forenses, para prognosticarem a acusação que irá ser feita ao homicida, ou recebendo no aeroporto os amigos, de ar compungido, do morto.
É para isto que serve a informação televisiva, incluindo a do canal público que nós pagamos: para preencher o espaço deixado vago pelo desaparecimento do jornal O crime.
Desculpem o desabafo: a informação televisiva tem mesmo de ser esta espécie de teledifusor de lixo? Que raio se ensina nos cursos de comunicação e de jornalismo?
E desculpem o excesso de aspas: servem para eu resistir à tentação do vernáculo menos próprio, chamando às coisas os nomes que às coisas são.
O primeiro traço deveria ser completamente irrelevante, já que emerge da liberdade de orientação sexual, que apenas a cada um diz respeito. Todavia, considerada alguma prosa que a ocasião suscitou, terá tornado a vítima mais digna de dó – vá-se lá saber porquê!
O segundo, considero-o pouco menos que desprezível: significa que a criatura “ganhava” a “vida” a escrevinhar coscuvilhices e a debitar maledicências, chafurdando nos dejectos dos socialites.
A viagem que o levou a Nova Iorque tinha um óbvio móbil “romântico”, que a comunicação social preferiu apenas insinuar, não por pudor, mas porque a insinuação vende melhor do que a afirmação: tratava-se, simplesmente, de seduzir um jovem de 21 anos.
Quanto a este, também os seus motivos parecem evidentes: “pendurou-se” no idoso para, explorando as suas “inclinações”, beneficiar dos seus supostos contactos internacionais, iniciando uma carreira no mundo da moda.
Estavam, pois, bem um para o outro.
Nada me interessam os pormenores abjectos que rodearam o assassinato. Deixo-os aos media, lambendo os beiços com a sordidez da história, muito melhor do que o criador de qualquer reality show poderia inventar.
O que não posso deixar de lastimar é a falta de vergonha da nossa comunicação social, com destaque para as televisões: há uma semana que os noticiários das 8 abrem com dez ou quinze minutos da "tragédia". Não as imagens horríveis das cheias no Brasil – que ficaram sempre para depois – mas as imagens ridículas dos correspondentes em Nova Iorque, repetindo à exaustão o detalhe dos testículos cortados e a agressão com um televisor (?) – que deve ser um crime especialmente hediondo, aos olhos de quem trabalha para uma cadeia de televisão – e entrevistando em prime time advogados de sotaque extravagante e peritos forenses, para prognosticarem a acusação que irá ser feita ao homicida, ou recebendo no aeroporto os amigos, de ar compungido, do morto.
É para isto que serve a informação televisiva, incluindo a do canal público que nós pagamos: para preencher o espaço deixado vago pelo desaparecimento do jornal O crime.
Desculpem o desabafo: a informação televisiva tem mesmo de ser esta espécie de teledifusor de lixo? Que raio se ensina nos cursos de comunicação e de jornalismo?
E desculpem o excesso de aspas: servem para eu resistir à tentação do vernáculo menos próprio, chamando às coisas os nomes que às coisas são.
Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa – Campus de Campolide – 1099-032 LISBOA
Tel: 213847400 Fax: 213847471 e-mail jc@fd.unl.pt
JOÃO CAUPERS - professor
1 comentário:
Concordo plenamente! Durante dias, os telejormais não abriram com outra notícia... e acrescentaram algo novo em cada abertura? Claro que não!! Se algum pormenor houve, foi mais em jeito de revista cor-de-rosa, do que outra coisa.
Num desses dias morreu um capitão de Abril... a notícia teve algum destaque nas televisões? A resposta é uma vez mais, "claro que não!!". Continuamos a gastar (e não dedicar) tempo a um assunto gasto e sem novidades. Quando o moço for a julgamento vai ser um pouco mais do mesmo... é o que temos!
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