Tachos da Caixa. Administradores ficam com negócios privados
por Margarida Bon de Sousa, Publicado em 26 de Julho de 2011
São muitas as linhas por onde se cose a nova administração da CGD, ou como o banco público serve de laboratório da coligação.
Eduardo Paz Ferreira, Pedro Rebelo de Sousa e Álvaro Nascimento, todos advogados, farão parte da comissão de auditoria da nova comissão executiva da Caixa Geral de Depósitos (CGD) em regime de não exclusividade. Pedro Rebelo de Sousa continuará deste modo a trabalhar no seu escritório de advogados, que representa empresas como a italiana ENI, accionista da Galp e que chegou a negociar a venda desta participação, negócio onde a Caixa Geral de Depósitos mantém uma palavra a dizer.
As escolhas para a CGD continuam envoltas em polémica. Primeiro, foi noticiado que António Nogueira Leite iria ser presidente da Caixa, intenção contrariada pouco depois pelo “Jornal de Negócios”, que o confirmava como vice-presidente da comissão executiva, presidida por José Agostinho de Matos. Na sexta-feira à noite, a CGD acabou por divulgar os 11 membros do novo conselho de administração – o anterior tinha sete –, sem diferenciar os executivos dos não executivos. Só amanhã ficará definido oficialmente o novo modelo de gestão do banco estatal.
Certo é que a comissão executiva será presidida por José Agostinho de Matos, por indicação do ministro das Finanças, e Nogueira Leite será o seu vice, por escolha do primeiro-ministro. O facto de Nogueira Leite ter trabalhado durante alguns anos no grupo Mello e de a saúde ser uma das áreas a alienar pelo banco público causou também algum desconforto no sector.
Outra entrada inesperada na CGD foi a de Nuno Fernandes Thomaz, para administrador-executivo, defendida por Paulo Portas, que assim garante a representação do CDS/PP nos órgãos do banco estatal. Recorde-se que Nuno Fernandes Thomaz, que foi secretário de Estado dos Assuntos do Mar no governo de Santana Lopes, chegou a defender, durante a campanha de 2005, um Museu da Bíblia no Norte e a construção de um parque temático como a Eurodisney no Sul de Portugal. Ontem, vendeu a sua posição na ASK e pediu a demissão dos cargos que desempenhava.
Como membros da mesa da assembleia-geral da CGD foram eleitos pelo accionista Estado para o mandato 2011-2013, Manuel Lopes Porto, presidente, Rui Machete, vice-presidente, e José Soares, para secretário. Faria de Oliveira mantém-se na empresa, mas agora como chairman, sendo os restantes vogais Norberto Rosa, Jorge Tomé, Rodolfo Lavrador e Pedro Cardoso.
Fricção Nos meandros deste processo estão outros enquadramentos mais complexos, como seja o primeiro sinal de que Paulo Portas está atento à defesa dos interesses do CDS/PP na coligação com o PSD. Segundo o i apurou, Portas não gostou que o primeiro-ministro tivesse chamado a si a tutela de repensar a diplomacia económica. Para tal, Passos Coelho convidou o ex-ministro de Cavaco Silva, Braga de Macedo, o ex-ministro das Finanças de Sócrates Campos e Cunha e o ex-ministro dos Negócios Estrangeiros de Santana Lopes, António Monteiro, que têm 45 dias para criar um novo modelo, mais eficaz, para captar investimento estrangeiro para Portugal.
Recorde-se que a diplomacia económica nunca esteve sob a alçada do primeiro-ministro. O projecto foi delineado pelo executivo de Durão Barroso, quando Martins da Cruz era ministro dos Negócios Estrangeiros. Na altura, os embaixadores foram convidados a fazer menos política do croquete e mais negócios nos países onde representavam Portugal, tendo havido inclusive uma coordenação activa com as delegações do ICEP no mundo.
António Monteiro continuou com a iniciativa durante o governo de coligação PSD-CDS/PP, embora até hoje não tenha sido feito nenhum levantamento quantitativo ou qualitativo sobre os resultados práticos desta nova diplomacia.
Agora Passos quer um novo modelo de interligação entre os vários serviços de captação do investimento estrangeiro, tendo chamado a si a tutela da Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal (AICEP), que no governo socialista respondia ao ministro da Economia. Na prática, este organismo terá de convencer mais empresas a virem para o país, numa altura em que a burocracia estatal continua a travar muitos investimentos e os tribunais não dão resposta às litigações.
QREN O facto de cerca de 90% do Quadro de Referência Estratégico Nacional (QREN), que reúne os apoios da União Europeia para o desenvolvimento do país, ter ficado sob tutela de um ministro do CDS, neste caso Assunção Cristas, que ficou responsável pelo Ministério da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território, também está a causar desconforto em muitos círculos do PSD. É cedo ainda para avaliar da velocidade e do deslizar desta locomotiva nos próximos meses. Porém, como dizia recentemente uma fonte do PSD ao i, “este governo tem tudo para dar errado, por isso talvez dê certo”.
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