quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

É JÁ AMANHÃ - APARECE!

CÂMARA MUNICIPAL DE PALMELA - CONVITE


A CÂMARA MUNICIPAL DE PALMELA E O AUTOR
CONVIDAM-NO
PARA A APRESENTAÇÃO DO LIVRO
TAMBWE - A UNHA DO LEÃO
A SESSÃO TERÁ LUGAR NO DIA 17 DE FEVEREIRO,
ÀS 21 HORAS,
NA BIBLIOTECA MUNICIPAL DE PALMELA,
NO LARGO DE S. JOÃO Nº6
EM PALMELA
O LIVRO SERÁ APRESENTADO PELA
DRª ANITA VILAR.
VIAGEM MUSICAL COM O SAXOFONISTA
RAFAEL LOPES.
LEITURA DE EXCERTOS DO LIVRO POR
CECÍLIA NUNES.
EXPOSIÇÃO DAS ILUSTRAÇÕES
DO PINTOR
NUNO DAVID

EXCERTOS DO CAPÍTULO 7 DO LIVRO "TAMBWE-A UNHA DO LEÃO"

[.........]

NASCI NUM LUGAR ESTRANHO.
TÃO ESTRANHO QUE NUNCA O CONSEGUI IDENTIFICAR NO MAPA.
VOLÁTIL COMO A ARAGEM, TORNAVA-SE INACESSÍVEL AOS AMBICIOSOS QUE LHE QUERIAM CONHECER OS SEGREDOS[...]
LUGAR ASSIM, FICAVA EM PALCO NENHUM. APENAS ALI CONSEGUIAM CHEGAR AQUELES QUE SE ESQUECIAM DO TEMPO, AQUELES QUE OLHAVAM A ALMA COMO SE LESSEM UM LIVRO ABERTO[...]
TODOS OS HABITANTES DO ESTRANHO LUGAR ONDE NASCI ERAM SERES NEM BRANCOS, NEM NEGROS, MAS DE PELE FRESCA GRAÇAS AO VENTO DA MONTANHA QUE CERCAVA A ALDEIA COM UM ANEL DE ROCHAS E MISTÉRIO[...]
LUGAR ESTRANHO, ESTE, EM QUE PESSOAS E NATUREZA SE HARMONIZAVAM COMO SE FOSSEM UM SÓ, MIMETISMO SALVADOR QUE OS PROTEGIA DA DEVASSA DOS PREDADORES[…] ÀS ESTRADAS ANTIGAS A PERSISTÊNCIA DOS DIAS DISFARÇAVA-LHES A SINUOSIDADE DO CORPO, ÀS PONTES IMPROVISADAS A IRA DO TEMPO ROUBAVA-LHES A UTILIDADE[...]
LUGAR ESTRANHO, ESTE, ONDE NASCI. BASTAVA A MÃO BENFAZEJA DA CHUVA TÉPIDA SOBRE O CORPO SENSUAL PARA QUE AS CHAGAS ESCAVADAS NA TERRA CICATRIZASSEM.
LUGAR ESTRANHO, ESTE, EM QUE NASCI; AS MULHERES, OS HOMENS, AS CRIANÇAS, RIAM-SE POR TUDO E POR NADA: DO VOO DO PÁSSARO, DO UIVO DO CÃO, DO RASTEJAR DA COBRA[...]
LUGAR ESTRANHO ONDE AS PESSOAS ERAM FELIZES SEM O SABEREM[...]
NASCI NUM LUGAR ASSIM, NUM RECANTO ESCONDIDO DA TERRA, TÃO BELO QUE AINDA HOJE SINTO, DURANTE O SONO, QUANDO FAÇO AMOR, O VENTO SECO E FRESCO NASCIDO NAS GRUTAS ONDE OS ANTEPASSADOS ADORMECIAM PARA SEMPRE[...]
À NOITE, ILUMINADOS PELO DIA DA LUA[…] EM SILÊNCIO[…] SUBÍAMOS POR VEREDAS PENDURADAS SOBRE PRECIPÍCIOS ATÉ ÀS GRUTAS ONDE O VENTO NASCIA[...] ERA UM MOMENTO DE MAGIA. TODOS SABÍAMOS O QUE IA ACONTECER[...] A GRUTA TRANSFIGURAVA-SE. A UMA SUCESSÃO DE ESTRONDOS, PROVOCADOS PELA ABRUPTA ABERTURA DAS PORTINHOLAS DOS NICHOS, LIBERTANDO AS ALMAS ADORMECIDAS, SUCEDIA UMA DANÇA DE FOGOS-FÁTUOS[...] O CULTO, A FESTA, O CERIMONIAL, DURAVA O TEMPO NECESSÁRIO À ALIMENTAÇÃO E LIBAÇÃO DAS EXIGENTES E INQUIETAS DIVINDADES FAMILIARES[...]
TUDO ERA DIFERENTE, EXTRAVAGANTE, NA REALIDADE DA TERRA ONDE NASCI. AS MULHERES ESPERAVAM-NOS, ESCONDIDAS ENTRE A VEGETAÇÃO LUXURIANTE.IMPOSSÍVEL RECUSAR[...] ARRASTAVAM A DOCILIDADE DO MACHO EXCITADO PARA A SOMBRA DAS ÁRVORES, ESFREGAVAM-LHE O CORPO COM ERVAS DE CHEIRO SULFUROSO, SECAVAM-NO COM TERRA E APODERAVAM-SE DO CORPO COMO O DEMÓNIO SE APODERA DAS ALMAS DESAVINDAS. FINDA A ORGIA, OS CORPOS DEAMBULAVAM PELAS SENDAS DA FLORESTA DURANTE DIAS, COMO SE ESTIVESSEM EMBRIAGADOS, EM DIRECÇÃO ÀS ÁGUAS DOS RIOS QUE LHES ARREFECIAM O ÂNIMO E A LOUCURA DOS MÚSCULOS INCANDESCENTES[...]
QUANDO NASCI, A ALDEIA INTEIRA FOI VER-ME[...] NUM CERIMONIAL PREPARADO EM SEGREDO, ESCONDERAM-ME NUM CÍRCULO DE GENTE QUE CANTAVA E BESUNTARAM-ME O CORPO COM ÓLEOS DE JIBÓIA PARA O PROTEGER DAS DOENÇAS[…] SOB A LÍNGUA, QUE ANSIAVA POR UM POUCO DE LEITE, DEPOSITARAM CRISTAIS DE GIRASSONDE QUE ME TORNARAM, PARA SEMPRE, ROBUSTO[...] FANTASIA DO PRINCÍPIO DO MUNDO[...]
ERA UM LUGAR ESTRANHO, ESTE, ONDE NASCI; SEM LEI QUE NÃO FOSSE A DOS SENTIDOS, SEM AUTORIDADE QUE NÃO FOSSE A QUE EMANAVA DA MAGIA DOS ESPÍRITOS DOS ANTEPASSADOS[...] UM LUGAR DE FANTASIA, SEM HORAS NEM TEMPO[...]
EM TERRA ASSIM, TODOS ÉRAMOS FEITICEIROS.

(EXCERTOS DO CAPÍTULO 7 – A ALDEIA DOS HOMENS MÁGICOS – DO ROMANCE TAMBWE-A UNHA DO LEÃO)
Nesta hora (BLOGUE)
Escrever porque sim. Dizer. Neste tempo e nesta hora. Sobre os momentos e sobre as coisas que os fazem. Contacto: joaoreisribeiro@netvisao.pt

António Oliveira e Castro: "Tambwe" ou o mundo pelos olhos de Eugénio

O mais recente romance de António Oliveira e Castro, Tambwe – A unha do leão (Lisboa: Gradiva, 2011), com ilustrações de Nuno David, é uma história que prende o leitor ao trajecto de uma personagem como Eugénio, figura que, ora procura a morte, ora assume o seu trajecto sozinho, ora peregrina até às raízes. A história é intensa e o leitor é convidado a passar por paisagens diversas, europeias (Portugal, França) ou africanas (Angola), por corredores diversificados de uma sociedade que nem sempre se rege pelos melhores princípios, convivendo com figuras da baixa política, com revolucionários, com mercenários, e tendo momentos de paragem, também fortes, em pensares de tempos de solidão ou em reflexão com figuras que constroem e se alojam na identidade.
É uma história dramática, em que o narrador dialoga com o leitor, tentando convencê-lo da verosimilhança das situações e levando-o a pensar a actualidade, o papel da política, o encaminhamento do mundo, o ser cidadão. É uma história dolorosa, com desvios e demandas, mortes e utopias, caos e ordem, poesia e horror, em que a liberdade e a prisão coexistem e a fragilidade do mundo e dos sistemas é posta à prova. É a história de uma solidão sempre e sempre testada, numa fuga ao tormento.
Sublinhados
Palavras – “As palavras, por maior que seja o seu conteúdo, não têm peso, sustentam-se de aparentes levezas, da aragem dos êxtases.”
Mistério – “Nem sempre o universo do homem se pode resumir ao encontro com a razão, na equação entram outras incógnitas, indecifráveis e misteriosas.”
Faltas – “O que mais há na terra é paisagem e o que mais falta é o amor.”
Escrever – “Nenhum escritor escreve sobre acontecimentos insignificantes, procura sempre o lado sombrio, sujo, sanguinolento, colérico e escondido do Homem; descreve os campos de batalha onde se fuzilam os inocentes e assinam acordos de paz com os generais; o artífice da palavra relata, com a emoção de que é capaz, a loucura dos heróis, o medo dos cobardes; leva-nos até aos que jazem, na agonia da morte, debruçados sobre a terra que lhes escuta o lamento; faz-nos tropeçar nos corpos dilacerados que se espalham sobre os degraus dos edifícios em ruínas.”
Amor – “O amor é um fenómeno muito mais complexo que a morte; enquanto um regenera, o outro remete para o esquecimento.”
Vida – “Mesmo a vida mais verdadeira não passa do resultado do acaso, a que só a fé dos homens confere normalidade.”
Gerações – “O mundo acaba apenas para velhos que já não são capazes de se transformar, continua para os jovens generosos e sonhadores, que precisam de mudança.”
Futuro – “Nada, nada mesmo, obedece à lógica; apenas a aventura, o perigo, o risco, o sucesso imprevisto comandam o futuro.”
Castigo – “Os castigos são sempre subjectivos. Dependem de quem está no poder. Herói se vencer, traidor se for derrotado.”
História – “A história despreza os seus actores, reescreve-lhes o drama a seu bel-prazer; a qualquer instante pode matar num jogo de contradições, de paradoxos, de ironias, de injustiças; oportunista, caminha sobre uma estrada de cadáveres.”
Guerra – “A guerra não distingue os homens; tanto se lhe dá que sejam honestos ou assassinos, jovens ou velhos, pouco lhe importa que se encontrem exaustos ou frescos. Aliás, a violência tem especial predilecção pelos mais incautos, pelos mais fracos.”
Actor – “Apenas quando encarnam personagens que um qualquer dramaturgo inventou, os actores são belos, sedutores, insuspeitos, assim que abandonam o palco e a ribalta regressam à miserável condição humana que os agasalha.”
Pátria – “Para que precisamos de nações? Os cidadãos precisam é de paz!”
Povo – “A história dos povos tem as suas regras, o seu tempo lento, mas as mudanças são muito mais definitivas quando a violência da guerra se torna conselheira da razão e das emoções.”
Trincheira – “Nas trincheiras, sempre morreram os jovens crédulos, cadáveres condecorados com a crueldade do martírio. Indiferentes à hecatombe, os proprietários da pátria, latifúndio com milhares de hectares, que fazem crer ser também nossa, oferecem-nos o privilégio de lhes amanharmos o solo, de lhes produzirmos a riqueza.”
Horizonte – “A dimensão dos homens vê-se para onde olham, se para o umbigo, se para a montanha.”
Ambição – “Os homens, quando guiados apenas pela ambição, perdem a noção da realidade, escutam o umbigo quando tudo à volta se desmorona.”

Sem comentários: