quinta-feira, 9 de julho de 2009

1ª Crónica



(Centum Cellas,foto da net)


Há dias fui a Belmonte, feudo, durante gerações, da célebre família Cabral. Debruçada sobre um vale onde a agricultura é ainda uma actividade que não envergonha, Belmonte celebra-se como que uma varanda de onde se espreita a Serra da Estrela. Linda, cuidada, florida, limpa, percebe-se que as autoridades autárquicas não descuram o rico património que publicamente juraram proteger. A sinagoga, inserida no velho bairro judeu, lá está como sinal dos novos tempos de tolerância; as casas da judiaria, talhadas em granito, refletem o esmero de quem nelas habita. A casa-museu de Pedro Álvares Cabral, o Museu Judaico, o Museu do Azeite, o Eco-Museu, o comércio de artesanato, a oferta gastronómica, são sinónimos de uma invejável vitalidade.
Contudo, esta não é uma história de final feliz. Quilómetros mais adiante, já fora de Belmonte, deparei com Centum Cellas, o enigmático monumento romano. Foi a desolação total. Perdido entre habitações de mau gosto arquitectónico, a velha torre de 3 andares jaz abandonada. Imagem deprimente de uma construção que os estudiosos destas coisas da História ainda não sabem para que serviu. Terá sido estalagem, base militar ou templo romano? Mistério! Por isso, é ainda mais chocante o abandono a que se encontra votada esta antiquíssima e valiosa construção. Mesmo protegida por uma vedação, qualquer cidadão menos escrupuloso ali pode entrar e vandalizar o que resta da monumentalidade do edifício.
Qualquer outro país da Europa mais atento à crise da sua economia e conhecendo o quanto o turismo pode contribuir para amenizar o défice das contas públicas, faria de Centum Cellas uma fonte de rendimento. Quem viaja, sabe que em nenhuma cidade europeia se visita a mais pequena capela sem pagar.
Entra-se em Centum Cellas como que num deserto; sem o mais miserável impresso que conte a sua odisseia, sem um guia, ou guarda, resta-nos pontapear as pedras e urinar atrás das suas imponentes paredes. Tudo de borla!
Pergunta-se.
Com tanto português desempregado a receber subsídios como se recebesse uma esmola, não seria oportuno e inteligente dignificar esses cidadãos, a quem as ingratas leis de mercado empurraram para a desagradável sensação de se sentirem inúteis, como apoios destes locais públicos? Vigiavam, mostravam, explicavam e cobravam entradas aos visitantes.
Ganhava o país, a auto-estima daqueles que um dia se viram sem trabalho, e os turistas que nos visitam.
Afinal, os recursos existem, basta saber geri-los!
António Oliveira e Castro.