segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

AS MENTIRAS DO PRIMEIRO MINISTRO - PENNE ALLA PUTANESCA

Penne alla putanesca


Que queres, responde Subir, esta é a minha vida, vais ver que daqui a 10 anos Portugal estará melhor. Entupi, de estupor.


  • Encontrei Subir Lall neste fim-de-semana, de regresso ao hotel, após um jogging vigoroso no corredor de Monsanto. Velho conhecimento de uma missão conjunta Fundo/Banco aquando da derrocada financeira da Tasmânia, apertámos os ossos e rememorámos um famoso jantar de penne alla putanesca no final de uma horrível primeira semana de missão.
    Então Subir, estás a terminar a tua missão e desejoso de largar este maravilhoso País? Desejoso, não, responde, porque gosto do vosso peixe e do vinho branco, mas um pouco farto de trabalho ingrato. Os resultados não são maus, mas as reformas profundas ainda estão longe: a laboral já com ganhos de competitividade salarial, a das rendas de casa ainda com poucos resultados e a dos tribunais muito à espera deles.
    Subir Amigo, a laboral não aumenta a competitividade, sem nova mentalidade dos empresários, rigorosa mas também audaciosa, por enquanto só reduz consumo. A do inquilinato está ainda para mostrar resultados, sim há mais casas para arrendar, mas os 28% de impostos sobre a renda só incentivam a não declaração. Se lhe somares o IMI tens composto o quadro de incentivos para a venda ao desbarato, a Espanhóis, Chineses e Angolanos. Quanto aos tribunais, veremos se o fecho de alguns não acumula trabalho e demoras nos outros. Meu caro, responde Subir, os detalhes não são comigo, deixo-os para o teu Governo, apenas te lembro que com a rigidez anterior não havia nem mobilidade, nem criação de emprego. Pois é, retorqui, agora até surgem novos pequenos empregos a trinta horas, a ¾ do salário mínimo, sem que os trabalhadores tenham coragem para largar o trabalho à hora contratual.
    Reconhecerás, responde Subir, que aniquilámos parte das rendas das produtoras eléctricas, restaurámos o equilíbrio financeiro nos transportes públicos e forçámos a redução de funcionários. E até ajudámos o governo a negociaras parcerias rodoviárias. Como te enganas, Subir, tens que ver mais longe do que te contam: a electricidade subiu mais que a inflação e poucos sabem das ajudas sociais existentes, os transportes públicos esse cancro urbano, nunca chegarão a pagar a dívida que transitou para as costas de todos os contribuintes e não parece que o Governo esteja interessado em os reestruturar e passar aos municípios, continuando a gerar risco moral. No que toca a funcionários, os que saíram do activo passaram todos à reforma, deixaram de contribuir, apenas custam um pouco menos. Quanto às parcerias, só foi negociado o corte de encargos com a manutenção de estradas, o que nos vai deteriorar o parque em poucos anos.
    Mas tens bons resultados nas exportações, que já cruzaram as importações, devolve Subir. É verdade, respondi, mas foi à custa da refinaria de Sines, da renovação nas papeleiras, da poupança de combustíveis pelo aumento das renováveis, tudo obras do Sócrates. Pode ser verdade, responde Subir, mas eu não cuido de nomes, cuido de países, somos poupados nos elogios e justos nos temores de que tudo desande: a exportação de combustíveis é conjuntural, pode estar perto da saturação, o aumento de consumo interno fará necessariamente crescer as importações e desequilibrar de novo a balança.
    Eu sei que o vosso relatório foi cauteloso, Subir, coisa que tanto desagradou a Portas e tão grossa fez a voz de Passos Coelho, ao ponto de ter anunciado mais austeridade logo na primeira sessão do congresso do seu partido. Sei também que alertaste para riscos sociais e económicos do desemprego elevado, sobretudo de jovens e diplomados, para as dívidas das empresas privadas – que já vão em 255% do PIB – para a enorme quebra do investimento, para a fraca competitividade da economia, afinal, tudo factores que a política restritiva do Fundo tanto agravou. Melhor seria terem dado ouvidos às recomendações dos vossos dirigentes, como Mme Lagarde, aliviando o arrocho. Pois é, responde Subir, fica-lhe bem, para consumo externo, criticar a família, mas se fosse eu o indiano Subir, mero chefe de missão, a formular tal comentário, seria de imediato transferido e colocado na lista negra. Também serviste no Banco, sabes como é, viste como o Stieglitz foi triturado e ostracizado, só sobrevivendo por deter um Nobel, mesmo assim passa por nós à distância dos leprosos. Caro Amigo, aqui cumpro ordens, apenas.
    Já agora, Subir, diz-me cá como vais conseguir que o Governo corte mais 2,5 milhares de milhões de 2014 para 2015, no gasto público, para fazer baixar o défice de 4 para 2,5%? Ah, isso não é comigo, é com o teu governo. Mas uma coisa é certa: livrem-se de aventuras eleitorais como essa tontice de baixarem impostos em 2015, podem deitar tudo a perder. A mim pouco importa que o primeiro-ministro se chame Coelho ou Seguro, que tenha ou não Portas, com o seu ridículo relógio em count-down à ilharga, ou que as finanças estejam a cargo de Gaspar, Maria Luís ou Trigo Pereira. Sou imune a pessoas e ideologias. E sempre te digo, isto está tão embaraçado que pouco diferirão na prática, uns e outros.
    Fiquei fulo com tamanha frieza, esbracejei: para ti é tudo igual, apertar os fracos ou aliviar os ricos? Que queres, responde Subir, esta é a minha vida, vais ver que daqui a 10 anos Portugal estará melhor. Entupi, de estupor.
    So long, Amigo, keep cool e não aceites cargos em nenhum governo, perderás o pouco cabelo que te resta. Soube-me a vingança de um calvo, mas aguentei: adeus Subir, bom trabalho nos teus países do Norte onde regressas.
    P.S. Como se pode depreender, qualquer semelhança dos actores com realidade é pura coincidência, nem Subir será insensível, nem eu terei pouco cabelo.
    Deputado do PS ao Parlamento Europeu
     

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