quarta-feira, 7 de setembro de 2011

PORTUGAL EM CEILÃO - SRI LANKA

LUÍS DE CAMÕES no Canto Primeiro da sua imortal Obra OS LUSÍADAS designa o Ceilão como a Taprobana:

Que, da Ocidental praia Lusitana,
Por mares nunca dantes navegados
Passaram ainda além da Taprobana,
Em perigos e guerras esforçadas
Mais do que prometia a força humana,
E entre gente remota edificaram
Novo Reino, que tanto sublinharam>>


Ante das naus de Portugal chegarem ilha do Ceilão (também conhecida pela terra da canela), o território já era conhecido na Europa e o naturalista romano, Plínio, depois de meados do século I já se refere à Taprobana na sua obra como sendo uma terra de elefantes. Ceilão na língua sinhalesa significa leão e, assim a “Ilha dos Leões”

No início do século I as rotas marítmas para a Índia e o Ceilão eram efectuadas pelo Mar Vermelho, aproveitando as monções. Cada viagem, de Julho a Setembro, demorava três meses e o regresso, de meados de Novembro a Fevereiro, igual tempo de percurso.

As especiarias e outros produtos da ilha chegavam aos mercados costeiros mediterrânicos, aos portos de Veneza, Piza e Génova pelas rotas de Ormuz, Tigre e Eufrates.

A descoberta da rota marítima por Vasco da Gama, em 1498, leva a que os portugueses venham a ser os senhores do comércio marítimo da Ásia.

Não são, de todo, faceis os contactos com as populações, dado que os árabes e os sultões otomanos eram os senhores da navegabilidade dessas águas e da permuta mercantil entre a Ásia e a Europa. As caravelas lusas navegam desde Goa, Ormuz, Malaca e não tardam a chegar aos portos do mar do Sul da China e do Japão.

Vasco da Gama, em Maio de 1498, aporta em Calecute, com quatro velas sob o seu comando.Em 1503 Afonso de Albuquerque conquista, definitivamente, Cochim (conhecido como a ilha da pimenta). Portugal fica com isto o senhor do comércio das especiarias e da navegabilidade nas costas de Malabar, do Coramandel, da baía de Bengala e, mais para o sul, do mar de Andaman, do estreito de Malaca e do Golfo do Sião (Golfo da Tailândia) e daqui aberta a porta para o extremo Oriente.

No ano de 1506, oito anos depois de Gama ter chegado a Calecute, os portugueses desembarcam em Ceilão, na ilha de Sinhala Dripa.

A ilha está dividida em vários condados tendo como chefe máximo um Grande Rei ou Imperador. Como religiões tem a budista e, com menor significado, a muçulmana e a hindu. É um país  muito fértil em produtos gerados pela terra, onde se destaca, em primeiro lugar a canela, a folha do betel e plantas corantes. É também rica em marfim, pérolas e safiras.

O palácio do Grande Rei está edificado na cidade de Kotte, que os portugueses tentaram desde logo dominar e, embora, com algumas dificuldades o propósito foi conseguido.

Após uma dúzia de anos (1518) dos portugueses chegarem a Ceilão já tinham construído uma fortaleza para defender o Rei de Kotte. Passado três anos (1521) dominam, totalmente, o comércio de Ceilão. A influência lusa expande-se, pela ilha e dentro dos muros do palácio imperial. Os sobrinhos do Grande Rei, princípes Raygam, Mayadunne e Bhuvanaikabahu conspiraram contra o tio, para, assim, concretizarem as sua ambições de Poder e assassinam-no. O propósito dos conspiradores era o de dividirem o Reino em três parcelas. Dada a sua influência e poderio, os portugueses são chamados a arbitrarem a contenda.

O portugueses colocam-se ao lado do princípe Bhuvanaikabhu que entronizaram como Rei de Kotte. Como seu colaborador fica o irmão Raygam, que faleceu pouco depois. Ao princípe Mayadunne foi-lhe oferecido o condado de Sitavaka. Mayadunne aliou-se aos muçulmanos de Calecute, que, alarmados com a influência dos portugueses na corte do Rei de Kotte viram nesta aliança a oportunidade para atacar e destronar Bhuvanaikabhu.

Foi pedido auxilio naval a Goa, ao Vice-Rei D.Garcia de Noronha, partindo dali uma armada comandada por Miguel Ferreira para reforço da defesa da ilha.

As disputas entre os portugueses e muçulmanos eram constantes. Em 1538 Martim Afonso de Souza desbarata a frota muçulmana e entra triunfalmente em Kotte. No ano seguinte, os muçulmanos voltam a tentar derrotar os portugueses e chamar a eles o comércio da ilha. São definitivamente derrotados por Miguel Ferreira, à porta de Kotte.

Miguel Ferreira um português de convicções, depois de vencer os muçulmanos avança, com os seus aliados sinhaleses e suas tropas para Sitavaka e exige um tratado de paz com Mayudunne. Uma das condições impostas era que lhe entregasse as cabeças dos líderes muçulmanos.

Miguel Ferreira em 26 de Novembro de 1539 está de regresso a Goa e elabora um extenso relatório ao Rei D. João III a dar-lhe conta da vitória sobre os muçulmanos em Ceilão.

Numa das passagens do relatório Miguel Ferreira informa o rei de Portugal, do seguinte: que enviara como seu emissário Manuel Queiróz para negociar a paz com Mayadunne e uma das suas exigências era que lhe entregasse as cabeças dos líderes muçulmanos.

Passagens do relatório dirigido ao Rei João III de Portugal

<<...e no derradeiro os mandou matar e me mandou as cabeças delles e mandou-me a cabeça de Patemerqua e a de Cunhalemerqua e seu sobrinho e a de hu seu cunhado e d’outros muytos capitães e alargou a el-Rey todas as terras que tinha e todos os portos do mar que tinha e pagou a el-Rey todos os gastos, que tinha feitos na guerra. E asy se veo el-Rey pera Cota muito ledo e muito comtente louvando muito a Vossa Alteza, que lhe mamdara emtregar seu Reino tudo ha elle perdido.>>

O prestígio de Portugal no Oriente aumenta e em 1542 uma delegação diplomática do Ceilão. chefiada pelo Embaixador Sri Radaraksa, parte com destino a Lisboa, fazendo escala em Goa, para se avistar com o Rei D. João III.

Seguem presentes para o monarca português e duas estatuetas, uma com a figura e a altura do Princípe Dharmapala, e uma coroa de ouro maciço para que D.João III lha colocasse na cabeça como forma de o entronizar como Rei de Kotte e herdeiro de Bhuvanaikabhu que sempre estivera ao lado dos portugueses.

A cerimónia, segunda foi narrada pelo Padre F. Queiroz (1687) : “que o Embaixador do Ceilão foi recebido por D.João III, que coroou o Príncipe na presença de grandes personagens do reino, aos quais foi lida uma mensagem.”

Em princípios do ano de 1541, D. Martim Afonso de Sousa, quando assumiu o alto cargo de Governador da Índia, cerimónia que teve lugar em Lisboa, teria garantido a S. Francisco Xavier que a ilha de Ceilão estava pronta para aceitar a religião Cristã e a conversão da população. A informação transmitida ao Apóstolo das Índias já tinha sido dada oficialmente, a partir de Goa, ao rei de Portugal por D.Estevão da Gama, segundo filho de Vasco da Gama. Francisco Xavier chega a Goa em 1542 para a missão, ao serviço do Rei de Portugal, de cristianizar o Oriente. Porém a realidade será outra.
De facto o cristianismo penetrou na ilha do Ceilão mas nunca ganhou raizes e passados 460 anos apenas 8% da população é cristã, 69% budista, 15% indu e 8% muçulmana.

O Rei de Portugal firmou vários tratados com o Rei de Ceilão. Através deles Portugal estabelece a mais absoluta suserania sobre o Ceilão e o seu Rei. 


Almeirim, 12 de Março de 1543

Alvará de D.João III para Bhuvaneka Bahu a respeito do direito de sucessão do Príncipe Dharmapala;

Almeirim, 13 de Março de 1543

Alvará de D.João III para Bhuvaneka Bahu a respeito do comércio dos portugueses em Ceilão;

Almeirim, 13 de Março de 1543

Alvará de D.João III para o Rei Bhuvaneka Bahu a respeito da construção naval dos portugueses em Ceilão;

Almeirim 13 de Março de 1543

Alvará de D.João III para Bhuvaneka Bahu a respeito das terras dos portugueses em Ceilão;

Almeirim, 13 de Março de 1543

Alvará de D.João III para Bhuvakeca Bahu a respeito do controle ou vigilância dos barcos;

Almeirim, 14 de Março de 1543

Alvará de D.João III para Bhuvaneka Bahu a respeito do comércio de compra e venda dos portugueses;

Almeirim, 14 de Março de 1543

Alvará de D.João III para Bhuvaneka Bahu a respeito dos direitos alfandegários;

Almeirim, 14 de Março de 1543

Alvará de D. João III para Bhuvaneka Bahu a respeito dos direitos a pagar pelos Neo-convertidos;

Almeirim, 16 de Março de 1543

Alvará de D. João III para Bhuvaneka Bahu a respeito do lugar de interprete em Ceilão;

Almeirim, 16 de Março de 1543

Alvará de D.João III para Bhuvaneka Bahu sobre o lugar de camareiro-mor do Rei de Kotte

São, assim, assinados 13 Alvarás que continuam a garantir ao Rei de Portugal a concessão do comércio geral com o Reino do Ceilão.

O relacionamento entre os dois reinos é salutar. Prova-o os presentes valiosos oferecidos ao Rei João III e aos vice-Reis da Índia. O Rei Bhuvaneka conhecendo o poderio naval dos portugueses, com bases em Goa e em Malaca, percebe que só Portugal lhe pode garantir (mesmo com os monopólios concedidos) o trono e a coroa.


Em 1982 visitei a ilha por 15 dias. Não fazia a mínima ideia de que os portugueses tinham passado por ali e permanecido pelo curto espaço de cerca de um século. Antes do avião aterrar no aeroporto de Colombo deparamos, do alto, com uma beleza que nos maravilha.

A poucos quilómetros do aeroporto e quase a entrar na cidade de Colombo deparo com tabuletas a anunciar lojas comerciais escritas com nomes portugueses. Ali estão os Sousas, os Gamas, os Xavieres, os Coutinhos e outros nomes e apelidos lusos.

Entretanto não ficaram só os nomes, mas também a memória da passagem dos portugueses por Ceilão. Ela constitui um facto e maior foi a nossa convicção depois de viajarmos de comboio de Colombo a Baticola (há aqui um forte português com canhões da fundição do Manuel Bocarro de Macau), Jafna e Kenkansantorai. Foi visível a satisfação das pessoas com quem falámos quando lhe dissemos que eramos de Portugal.

A norte, na província de Jafna, numa pequena povoação costeira de nome Kenkansantorai, hospedei-me numa humilde pousada do Governo de Sri Lanka. O gerente dessa pousada, da etnia sinhalesa, Joaquim de Sousa, quando soube que eu era português foi buscar-me um livro da terceira classe, do ensino elementar e um gravador e pediu-me que lhe gravasse toda o conteúdo para que o aprendesse. O que naturalmente o fiz da primeira à última página.

No reinado de D.Manuel I é cunhada moeda em Goa, Cochim e Malaca; nos de D.João III e D. Sebastião em Goa; na era filipina e no reinado de D.João IV a moeda continua a ser cunhada nas Casas da Moeda de Goa e do Ceilão.


Duzentas e dezanove palavras lusas foram introduzidas na língua sinhalesa. E mais, os pandeiros do Minho, as peneiras de arame, as almofadas de rendilheiras de Vila do Conde, os bilros da Póvoa de Varzim, as espichas de osso para correias de roca de Santa Maria de Portuzelo, as lanternas das Alminhas, as camisas de mulher de Viana do Castelo ainda hoje estão em uso Sri Lanka.

Sobre a história de Portugal no Ceilão há muito mais para descrever durante os 165 anos de permanência lusitana na ilha.


P.S. Foi-me muito últil a informação recolhida da obra “Portugal na História e na Arte de Ceilão “Tombos of Ceylon (Arquivo Histórico Ultramarino) – Ceilão e Portugal-Relações Culturais de B. Xavier Coutinho - Lisboa 1972

P.S. O texto tem alguns erros ortográficos e de pontuação.

Posted by Jose Martins at 8:10 PM

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