Por mais que o PSD grite vitória, a verdade é que o resultado destas eleições é uma vitória de Pirro. Mas a democracia tem destas armadilhas e perversidades: entrega o poder a quem tem mais votos não a quem tem melhor ideologia. Aliás, a ideologia nada vale frente à demagogia. No caso português ganhou quem defende de modo igualmente válido e verdadeiro duas teses opostas: as leis de um mercado predador e ferozmente liberal (na convicção de que só este cria riqueza) e o desenvolvimento social e humano da população.
Nunca os donos do capital abrirão mão dos seus lucros e privilégios a favor daqueles que lhes
prestam serviços. Os trabalhadores nunca deixarão de ser mão de obra, bons quanto mais baratos
forem. É a lógica natural da multiplicação de dividendos que torna impossível conciliar o irreconciliável. Por isso se tornam necessários governos com preocupações sociais. Os governos, no conflito que opõe classes de cidadãos devem servir de juízes.
É hoje consensual que a actual crise económica mundial, que atirou com centenas de milhões de trabalhadores para o desemprego, se ficou a dever única e exclusivamente à especulação financeira daqueles que, muito justamente (de acordo com a sua ideologia) gostam de multiplicar os números dos lucros a partir do nada. Supremo milagre. Mas todos sabemos, intimamente, que os milagres não passam de fantasia.
O capitalismo moderno passou a considerar arqueologia a criação de riqueza a partir da indústria, da agricultura e das pescas. Produzir bens palpáveis, verdadeiramente transacionáveis, criadores de emprego é um serviço sujo, trabalhoso, próprio das economias emergentes. O capitalismo ocidental tornou-se preguiçoso e viciante como um jogo de casino. Ilude-se pois quem pensa que é sua preocupação o desenvolvimento harmonioso e sustentado da economia, a distribuição de riqueza. O objectivo único dos especuladores é a acumulação de fortunas improdutivas que sonegam recursos para fins inconfessáveis. Em Portugal, o que aconteceu com o BPN é o exemplo mais destacado do crime que beneficia uns poucos e acaba por ser suportado pelos contribuintes. O que foi feito dos milhares de milhões de euros desaparecidos deste Banco para lugar nenhum? Ninguém sabe nem ninguém, do poder, parece estar preocupado em conhecer-lhe o paradeiro.
Mais do que fazer frente à crise portuguesa, Pedro Passos Coelho, futuro primeiro-ministro, enfrentará este criminoso conceito de desenvolvimento do capitalismo ocidental. Será ele capaz de ultrapassar os seus preconceitos? Estou em crer que não! O líder do PSD não encontrará soluções para o descalabro económico português prisioneiro que está, em termos ideológicos, deste perverso esquema de criação de riqueza.
Não basta reduzir o défice, será necessário criar verdadeira riqueza e distribuí-la por todos. Criar emprego.
Torna-se necessário recordar aqui que foi Cavaco Silva, antigo primeiro-ministro social-democrata, que acabou com a agricultura e pescas portuguesas, trocando-as com a União Europeia por auto-estradas. O desemprego dos portugueses começou aí.
O tempo é o melhor conselheiro de todos. Não tardará muito para que aqueles portugueses que deram o poder a Passos Coelho se mostrem arrependidos e venham para a rua reclamar. É que ninguém parece ter percebido que a solução para a crise não passa por uma luta entre personalidades (Sócrates e Passos Coelho). A raíz do mal tem fundamentos ideológicos.
A verdade é que o PSD governará contra a maioria dos portugueses.
PSD................................................. 2.145.450 eleitores
CDS................................................ 652.194 "
PS................................................... 1.557.864 "
PCP................................................ 440.850 "
BE.................................................. 288.076 "
Conjunto de pequenos partidos...... 246.228 "
ABSTENÇÃO................................ 3.875.022 "
VOTOS NULOS............................ 75.280
VOTOS EM BRANCO.................. 148.058
Ou seja, 6.783.572 portugueses não se identificaram com o projecto eleitoral do PSD!
A acreditar na evidência dos sinais, Passos Coelho formará governo com Paulo Portas.
Mesmo assim, PSD e CDS juntos apenas somarão 2.797.644 portugueses, ou seja, 6.131.378 cidadãos não se identificam com o governo que sair desta coligação.
Aceitar com um encolher de ombros estes números é preocupante para a saúde da democracia e um sinal de aviso de perigo para aqueles se obstinam em resolver a crise contra a vontade da maioria.
AOC
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