terça-feira, 1 de março de 2011

A VERDADE SOBRE SETÚBAL



“Setúbal – Fechados de Segunda a Sexta”

O SUL pediu-me para escrever um texto para esta edição e eu, sem reflectir, disse que sim. Ora o problema é motivação... Falar do quê? É que não há realmente nada a dizer. A cidade é linda, tão linda e perfeita que dói. Temos tudo do bom e do melhor e somos os maiores. Temos o Vitória a arrastar-se para não descer e a hipotecar-se anualmente para pagar uma equipe de futebol que nada ganha, o rio que sempre lá esteve, a serra que não aproveitamos, o estuário que ignoramos, os golfinhos que não protegemos devidamente ao ponto de fazermos uma festa de cada vez que têm uma nova cria e esta não morre, uma escola de turismo que é o ex libris daqueles que não conseguem acabar o 12º ano (mas claro que é aí que temos de concentrar o nosso investimento e dotá-los de infra-estruturas no centro da cidade. Uma coisa em grande, como deve ser!), uma Escola Superior de Educação das mais fáceis de entrar no pais, um Politécnico de quem nunca ninguém ouviu falar para lá de Alcácer ou Barreiro, uma verdadeira politica social salvaguardada pela nossa tradição em politicas de esquerda e tão avessa ao nepotismo (deve ser das poucas autarquias nacionais que não se deixa mover por lobbies partidários. É de uma integridade que, em Portugal, chega a ser comovente), um museu da cidade encerrado até que a vaca tussa, uma casa da cultura em construção que visa albergar os mesmos “velhos” de sempre (e ainda houve quem pensasse que a casa da cultura iria albergar projectos novos, encabeçados por gente nova e com uma visão de futuro. Há gente capaz de pensar em cada coisa!!! Ora isso seria uma tremenda irresponsabilidade, no mínimo...), um fórum Luísa Todi que vai ficar uma maravilha (quando ficar pronto que estas coisas levam tempo, muito tempo...), um novo, grande e imponente fórum comercial em construção que vai empregar muita gente com generosas remunerações de 500 euros (quando estiver pronto mas estas outras coisas ficam sempre prontas a tempo e horas), um auditório charlôt em construção que nunca mais meterá água (este é outro dos tais que demora tempo, muito tempo), um teatro de bolso que albergará uma companhia a quem já ninguém liga (mas não é a única porque na verdade nenhuma companhia em Setúbal leva público às salas. Mas claro que a culpa é do Estado, da Câmara ou do público pouco instruído e não dos profissionais talentosos e motivados que estão dispostos a tudo para devolver o brio à sua arte. Eles que tanto e tão bem se promovem), uma baixa desabitada e recheada de lojas que não cobrem a oferta (orientada por uma muito capaz associação de comerciantes que tem ideias brilhantes como pôr bandeirinhas à porta das lojas na altura do mundial porque é giro e “vai atrair para aqui muita gente”. E claro, estes só não fazem mais porque a Câmara não ajuda. Realmente como é possível que a Câmara Municipal, um organismo público, não dê avultadas quantias de dinheiro para investimento em negócios privados na Baixa de Setúbal? É impensável, “só mesmo em Setúbal!”), uma promessa de desenvolvimento com os empreendimentos de Tróia que não passou disso mesmo, de uma promessa. Sim porque digam lá porque razão o tio Belmiro se iria interessar por uma cidade que não se promove e insiste na comunicação e proliferação do popularucho? (E não tenho nada contra a cultura popular, adoro-a. O que me impressiona é a promoção folclórica do popular a nível institucional, isso sim é mais grave, desvirtua o popular e torna-o popularucho, triste). E temos o Toy, o Clemente, o Quim Gouviea ou o ultimo dos grandes hits, o grande Jorge Nice! Isto para não falar nessa Meca da cultura rencente, a grande loja do Charrôque da Prrofundurra (“Apah aquile é même gire, né? Apah muita gire même, ganda maluque!”)

E no fim admiramo-nos de nos tornarmos cada vez mais uma cidade periférica, dormitório na margem sul e com pouco interesse para lá do óbvio, vulgo peixe assado, choco frito e camas para albergar o pessoal que cá vem pastar ao fim de semana. No fundo o melhor seria fechar a cidade durante a semana e abrir apenas ao fim de semana para acolher os turistas, esses grandes comilões!

E pronto, é com tristeza que escrevo estas linhas sobre esta grande cidade onde todos somos os maiores. Sinto-me triste porque depois de tanto tempo a trabalhar fora de Setúbal e do pais, decidi voltar para apostar numa cidade que acredito poderia ser muito melhor se houvesse uma verdadeira estratégia concertada com vista ao futuro mas não... Tá tudo na mesma, eternamente à espera que venha daí um grande investidor, qual D. Sebastião do Sado, implementar um grande industria que nos salve a todos. E digo e repito, “estratégia concertada” pois o mal, assim como a solução, não está inteira ou exclusivamente no poder autárquico. Está em todos nós, públicos, privados, cães e gatos ou até no choco que importamos da Índia.

António Aleixo
Low Cost Filmes


(in Jornal O SUL - Fev. 2011)

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