sexta-feira, 21 de março de 2014
quarta-feira, 19 de março de 2014
ANTÓNIO LOBO ANTUNES- OS PORTUGUESES SÃO UNS INGRATOS!
Agora sol na rua a fim de me melhorar a disposição, me reconciliar com a
vida.
Passa uma senhora de saco de compras: não estamos assim tão mal, ainda
compramos coisas, que injusto tanta queixa, tanto lamento.
Isto é internacional, meu caro, internacional e nós, estúpidos, culpamos
logo os governos.
Quem nos dá este solzinho, quem é? E de graça. Eles a trabalharem para nós,
a trabalharem, a trabalharem e a gente, mal agradecidos, protestamos.
Deixam de ser ministros e a sua vida um horror, suportado em estoico
silêncio. Veja-se, por exemplo, o senhor Mexia, o senhor Dias Loureiro, o
senhor Jorge Coelho, coitados. Não há um único que não esteja na franja da
miséria. Um único. Mais aqueles rapazes generosos, que, não sendo
ministros, deram o litro pelo País e só por orgulho não estendem a mão à
caridade.
O senhor Rui Pedro Soares, os senhores Penedos pai e filho, que isto da
bondade as vezes é hereditário, dúzias deles.
Tenham o sentido da realidade, portugueses, sejam gratos, sejam honestos,
reconheçam o que eles sofreram, o que sofrem. Uns sacrificados, uns
Cristos, que pecado feio, a ingratidão.
O senhor Vale e Azevedo, outro santo, bem o exprimiu em Londres. O senhor
Carlos Cruz, outro santo, bem o explicou em livros. E nós, por pura
maldade, teimamos em não entender. Claro que há povos ainda piores do que o
nosso: os islandeses, por exemplo, que se atrevem a meter os beneméritos em
tribunal.
Pelo menos nesse ponto, vá lá, sobra-nos um resto de humanidade, de
respeito.
Um pozinho de consideração por almas eleitas, que Deus acolherá decerto,
com especial ternura, na amplidão imensa do Seu seio. Já o estou a ver:
- Senta-te aqui ao meu lado ó Loureiro
- Senta-te aqui ao meu lado ó Duarte Lima
- Senta-te aqui ao meu lado ó Azevedo
que é o mínimo que se pode fazer por esses Padres Américos, pela nossa
interminável lista de bem-aventurados, banqueiros, coitadinhos, gestores,
que o céu lhes dê saúde e boa sorte e demais penitentes de coração puro,
espíritos de eleição, seguidores escrupulosos do Evangelho. E com a
bandeirinha nacional na lapela, os patriotas, e com a arraia miúda no
coração. E melhoram-nos obrigando-nos a sacrifícios purificadores,
aproximando-nos dos banquetes de bem-aventuranças da Eternidade.
As empresas fecham, os desempregados aumentam, os impostos crescem,
penhoram casas, automóveis, o ar que respiramos e a maltosa incapaz de
enxergar a capacidade purificadora destas medidas. Reformas ridículas,
ordenados mínimos irrisórios, subsídios de cacaracá? Talvez. Mas
passaremos semdificuldade o buraco da agulha enquanto os Loureiros todos
abdicam, por amor ao próximo, de uma Eternidade feliz. A transcendência
deste acto dá-me vontade de ajoelhar à sua frente. Dá-me vontade? Ajoelho à
sua frente indigno de lhes desapertar as correias dos sapatos.
Vale e Azevedo para os Jerónimos, já!
Loureiro para o Panteão já!
Jorge Coelho para o Mosteiro de Alcobaça, já!
Sócrates para a Torre de Belém, já! A Torre de Belém não, que é tão feia.
Para a Batalha.
Fora com o Soldado Desconhecido, o Gama, o Herculano, as criaturas de
pacotilha com que os livros de História nos enganaram. Que o Dia de Camões
passe a chamar-se Dia de Armando Vara. Haja sentido das proporções, haja
espírito de medida, haja respeito.
Estátuas equestres para todos, veneração nacional. Esta mania tacanha de
perseguir o senhor Oliveira e Costa: libertem-no. Esta pouca vergonha
contra os poucos que estão presos, os quase nenhuns que estão presos como
provou o senhor Vale e Azevedo, como provou o senhor Carlos Cruz, hedionda
perseguição pessoal com fins inconfessáveis.
Admitam-no. E voltem a pôr o senhor Dias Loureiro no Conselho de Estado, de
onde o obrigaram, por maldade e inveja, a sair.
Quero o senhor Mexia no Terreiro do Paço, no lugar D. José que, aliás, era
um pateta. Quero outro mártir qualquer, tanto faz, no lugar do Marquês de
Pombal, esse tirano. Acabem com a pouca vergonha dos Sindicatos. Acabem com
as manifestações, as greves, os protestos, por favor deixem de pecar.
Como pedia o doutor João das Regras, olhai, olhai bem, mas vêde. E tereis
mais fominha e, em consequência, mais Paraíso. Agradeçam este solzinho.
Agradeçam a Linha Branca.
Agradeçam a sopa e a peçazita de fruta do jantar.
Abaixo o Bem-Estar.
Vocês falam em crise mas as actrizes das telenovelas continuam a aumentar o
peito: onde é que está a crise, então? Não gostam de olhar aquelas
generosas abundâncias que uns violadores de sepulturas, com a alcunha de
cirurgiões plásticos, vos oferecem ao olhinho guloso? Não comem carne mas
podem comer lábios da grossura de bifes do lombo e transformar as caras das
mulheres em tenebrosas máscaras de Carnaval.
Para isso já há dinheiro, não é? E vocês a queixarem-se sem vergonha, e
vocês cartazes, cortejos, berros. Proíbam-se os lamentos injustos.
Não se vendem livros? Mentira. O senhor Rodrigo dos Santos vende e,
enquanto vender o nível da nossa cultura ultrapassa, sem dificuldade, a
Academia Francesa.
Que queremos? Temos peitos, lábios, literatura e os ministros e os
ex-ministros a tomarem conta disto.
Sinceramente, sejamos justos, a que mais se pode aspirar?
O resto são coisas insignificantes: desemprego, preços a dispararem, não
haver com que pagar ao médico e à farmácia, ninharias. Como é que ainda
sobram criaturas com a desfaçatez de protestarem? Da mesma forma que os
processos importantes em tribunal a indignação há-de, fatalmente, de
prescrever. E, magrinhos, magrinhos mas com peitos de litro e beijando-nos
uns aos outros com os bifes das bocas seremos, como é nossa obrigação,
felizes.
António Lobo Antunes
terça-feira, 18 de março de 2014
DIA MUNDIAL DA POESIA - CULSETE-SETÚBAL
Caríssima/caríssimo,
Na próxima sexta-feira, dia 21 de março, Dia Mundial da Poesia, às 21:30 horas, a Culsete vai realizar no seu espaço o lançamento do livro coletivo Poemas para Manuel Medeiros. A sessão que assumirá a forma de tertúlia, será dirigida por Hélder Moura Pereira e José Teófilo Duarte, os mentores desta homenagem, e contará com a participação de outros poetas presentes no livro, como António Oliveira e Castro, Arlindo Mota, Artur Goulart e Fernando Gandra.
Apareça. Traga os seus amigos e venha ouvir ler e ler poemas para Manuel Medeiros.
F.R.M.
AJUDE A PROCURAR O AVIÃO DA AIR MALÁSIA, DESAPARECIDO.
AJUDE A PROCURAR O AVIÃO DA AIR MALÁSIA, DESAPARECIDO, ATRAVÉS DE IMAGENS DE SATÉLITE:
ALMOFADA DE PEDRA
Almofada de pedra
por VIRIATO SOROMENHO MARQUES
Como é que designaríamos o comportamento de um cidadão que, incapaz de honrar um crédito pessoal a uma taxa de 3,35%, prestes a atingir a maturidade, contraísse um novo empréstimo a uma taxa de 5,11% para pagar o primeiro ("troca de dívida")? Sem dúvida, tratar-se-ia de um comportamento pouco recomendável. E como seria classificado esse comportamento se o cidadão em causa utilizasse parte do novo empréstimo (de 11-02-2014) para antecipar, parcialmente, o pagamento em 19,5 meses do primeiro empréstimo, pagando 102,89 euros por cada 100 euros de dívida ("recompra")? Seria, certamente, uma atitude temerária, pois aumenta a despesa com juros para apenas empurrar a dívida para o futuro. Pois é isso que o Governo pretende fazer hoje. O leitor pode ir ao site eletrónico do IGCP. Abra o boletim mensal de fevereiro sobre "Dívida Pública". Na p. 2, vê que o Estado vai ter de resolver até 2016 cerca de 39 mil milhões de euros de empréstimos. Esse imenso obstáculo tem sido o pretexto para a constituição de uma volumosa "almofada" financeira. Tudo indica que o IGCP quer recomprar, hoje, uma parte de uma série de dívida a dez anos, contraída a partir de outubro de 2005 (ver p. 3). Se o fizer, às taxas mais recentes no mercado secundário, isso significa que, para o montante que for hoje amortizado, vamos pagar mais 3,53% de juros por ano até outubro de 2015 do que antes das duas operações financeiras supracitadas. Será isto uma gestão prudente, ditada pelo interesse nacional, ou estará o Tesouro público em risco para alimentar uma ilusão pré-eleitoral de triunfo? Será esta uma almofada que alivia o País, ou uma pedra amarrada às pernas que o atira para o fundo? Temos direito a saber a lógica com que se joga o dinheiro sonegado aos salários e às pensões. Direito a uma explicação, ou a uma beliscadela que nos acorde deste pesadelo.
ESTAMOS ENTREGUES AOS BICHOS!!!
ESTAMOS ENTREGUES AOS BICHOS!!!
MANIFESTO DOS 70 E O ÓDIO DE MORTE DOS YUPPIES AOS "VELHOS"
A RAIVA QUE O MANIFESTO DOS 70 PROVOCOU - por PACHECO PEREIRA
15 de Março de 2014 às 12:23
É difícil imaginar tanta raiva, tanta vontade de calar, tanto desejo de pura exterminação do outro, como aquele que se abateu sobre o manifesto dos 70 signatários a pretexto da reestruturação da dívida, uma posição expressa em termos prudentes e moderados por um vasto grupo de pessoas qualificadas, quase todas também prudentes e moderadas.
Nem isso poupou os seus signatários a uma série de insultos, acusações ad hominem, insinuações e o que mais adiante se verá. Sobre eles caiu a excomunhão que retira os seus nomes do círculo de ferro da confiança do poder.
Pelo contrário, alguns dos que os atacam ganharam o direito de lá entrar, e os que já estão lá dentro viram reforçada a confiança que lhes permite uma vida almofadada dos custos da crise. São os “responsáveis”, discordam às vezes no secundário, mas portam-se bem. Os 70, pelo contrário, portaram-se muito mal. Num mundo cada vez mais dos “nossos” e dos “deles”, bastante parecido com o paradigma marxista da luta de classes, os signatários cometeram vários pecados mortais, e ficaram do “lado errado”. É com eles que estou e é com eles que quero estar, não tendo assinado o manifesto apenas por incúria minha em responder a tempo ao convite que me foi feito. Mas é como se o tivesse assinado, por isso incluam-me na lista dos insultos, que já estou habituado.
Veio ao de cima tudo, a começar pelo primeiro-ministro, que os tratou de essa “gente”, ou porque tinham uma “agenda política” ou porque eram “cépticos” por natureza, inúteis para o glorioso esforço nacional de empobrecer como programa de vida. O manifesto era “antipatriótico”, com um timing inaceitável, a dois meses da “libertação” de 1640, feito pelos “culpados” do esbanjamento, pelos “velhos” a defenderem os seus privilégios, pelos defensores do statu quo dos interesses instalados, pelos “jarretas”, pela “geração errada”. O seu objectivo escondido, ao assinarem o manifesto, é outro, é “manter o modelo de negócio que temos, o Estado que temos, e atirar a dívida para trás das costas”, escreve António Costa em editorial do Diário Económico. José Gomes Ferreira é mais claro: “Estará a vossa iniciativa relacionada com alguns cortes nas vossas generosas pensões?”
Os argumentos ad hominem abundam. Alguns dos signatários que são de direita, um bom exemplo é Adriano Moreira, passaram a ter que ser de esquerda, o que é um modo muito interessante de lhes recusar a identidade, esvaziá-los do que foram toda a vida, para substituir essa identidade por aquilo que é, na sua pena, um anátema: “Já cá faltava um manifesto, de espectro partidário amplo, mas com uma ideologia única, de Esquerda”, diz, de novo, um editorial de António Costa no Diário Económico.
Cada vez mais se generaliza em Portugal a idade como insulto, diminuição, culpa, e todos são “velhos” por associação. Falta-lhes a desenvoltura dos “jovens”. José Gomes Ferreira pergunta: “Que tal deixarem para a geração seguinte a tarefa de resolver os problemas gravíssimos que vocês lhes deixaram? É que as vossas propostas já não resolvem, só agravam os problemas. Que tal darem lugar aos mais novos?” De facto, troquem Manuela Ferreira Leite, Bagão Félix, Vítor Martins, Sevinate Pinto, o presidente da CIP, Capucho, Sampaio da Nóvoa, Braga da Cruz, Gomes Canotilho, Manuel Porto, Teresa Beleza, e tantos outros, pelos “mais novos”, Relvas, Arnault, Marco António, Passos, pelos yuppies das consultoras financeiras que antes vendiam os swaps, e agora iam negociá-los para o Governo, pelos jovens lobos dos escritórios de advogados que fazem todos os negócios do Estado e vice-versa, sob a batuta de alguns velhos “que estão lá sempre”, pelo jovem que era para ser propagandista do Impulso Jovem, pelos gestores desempoeirados que usam o Twitter todas as horas e que circulam de cargos políticos para a Caixa, para a RTP, para Angola, dos ministérios para as empresas do PSI-20, ou aqueles que os chineses empregam para manter um link, útil, mesmo que caro. Manuela Ferreira Leite é “velha”, Catroga é novo. “Que tal darem lugar aos mais novos?”
Nos comentários dos blogues pró-governamentais, ou seja, no fim da cadeia alimentar, espuma-se de ódio junto com erros de ortografia, alguns dos quais eu corrijo para se perceber, outros ficaram: “Este tipo de "notáveis" (…) sinceramente mentem nojo. Concordo em pleno com o nosso primeiro-ministro com o facto de hoje em dia já nem sequer consegue responder a este tipo de escumalha que hoje em dia aparece na comunicação social, parlamento em fim....por todo lado”; “foi uma ideia idiota que passou pela cabeça de alguns”; “infelizmente estamos já habituados a que figuras da direita se mudem para a ideologia da esquerda irresponsável vá-se lá saber a troco de quê, ou talvez fácilmente se saiba...(…) São gente golpista, que facilmente vende a alma e a dignidade.” E estes são alguns comentários reproduzíveis, a maioria é puro insulto soez.
A imprensa económica teve nesta fronda contra o manifesto um papel central, enfileirou editoriais furiosos e notícias com títulos críticos sobre como o manifesto de nada valia e como felizmente ninguém ouvia estes “irresponsáveis”, repetindo os argumentos do antipatriotismo, do “timingerrado” que sairia “caro” ao país, caso alguém “ligasse” ao manifesto, que deitaria abaixo o adquirido pelos “sacrifícios” dos portugueses, como disse o primeiro-ministro e eles glosam. José Gomes Ferreira vai mais longe – se as coisas correrem mal, a culpa é vossa: “Mesmo sendo uma proposta feita por cidadãos livres e independentes, pela sua projecção social poderá ter impacto externo e levar a uma degradação da percepção dos investidores, pela qual vos devemos responsabilizar desde já. Se isso acontecer, digo-vos que como cidadão contribuinte vou exigir publicamente que reparem o dano causado ao Estado.” A mensagem essencial é “saiam da frente”, a mesma que está na capa e no título de um livro de Camilo Lourenço, que achava bem que houvesse um novo resgate porque isso “disciplinaria” os preguiçosos dos portugueses.
O que é que tocou esta corda hipersensível de governantes, jornalistas da imprensa económica, homens da banca, alguns empresários e os seus agentes na ideologia “orgânica” do “ajustamento”? Primeiro, voltar ao bom senso e deixar os revolucionarismos de “mudar Portugal”, mostrar que há uma política alternativa, que pode ser difícil, mas é muito mais realista do que a política actual, ou seja, que há alternativas. E, pelo caminho, revelar a grande hipocrisia em que assenta a política governamental, e em nome da qual os portugueses têm vindo a ter a vida estragada: é que para se pagar a dívida, tem que haver folga para o crescimento económico e qualquer outra solução é pura e simplesmente irrealista. A questão é que daqui a uns anos, quando tudo isto desabar, nenhum destes corifeus políticos dos “mercados” vai estar por cá, mas a sua herança estará.
Segundo, que essa alternativa implica uma nova forma de estar na Europa, ou seja, responsabiliza-nos pela acção e não pela submissão. É como num velho ditado gaullista sobre os comunistas: “Só fazem aquilo que lhes permitimos que façam”. E como nós permitimos tudo, fazem tudo. Na Europa é-se mais realista, incluindo nos “mercados”, do que se pensa e seja porque nós actuamos, ou seja a reboque do que pode acontecer na França, Itália ou Espanha, a política vai mudar. Só que, quando mais tarde Portugal o reclamar como membro de parte inteira da União, mais estragado estará o país, maior será o preço.
Terceiro, o manifesto revela que o único consenso transversal existente hoje na vida pública portuguesa, é exactamente aquele que põe em causa a actual política do Governo e dos seus apoiantes. O outro “consenso” assenta num rotativismo entre PS e PSD, obrigados a um pacto que impõe uma política “única” e a aceitação e institucionalização de um colaboracionismo face a uma Europa que pode aceitar “manter-nos”, mas com rédea curta e disciplinados. É apenas a blindagem da actual política em eleições, para que, quer se vote no PSD ou no PS, tudo continue na mesma. Esse seria um enorme risco para a democracia.
Este surto de raiva, com laivos claramente censórios, não me surpreende. Estava à espera dele, na sua magnitude e violência. E não vai acabar, vai-se tornar endémico. Ele é o efeito a curto prazo de uma política que se assume para vinte ou trinta anos de empobrecimento, centrados num único eixo: pagar aos credores, obedecer aos mercados. Essa política não pode ser conduzida em democracia, só pode existir com base num regime autoritário.
(No PÚBLICO de 15 de Março de 2014. José Pacheco Pereira é historiador)
Nem isso poupou os seus signatários a uma série de insultos, acusações ad hominem, insinuações e o que mais adiante se verá. Sobre eles caiu a excomunhão que retira os seus nomes do círculo de ferro da confiança do poder.
Pelo contrário, alguns dos que os atacam ganharam o direito de lá entrar, e os que já estão lá dentro viram reforçada a confiança que lhes permite uma vida almofadada dos custos da crise. São os “responsáveis”, discordam às vezes no secundário, mas portam-se bem. Os 70, pelo contrário, portaram-se muito mal. Num mundo cada vez mais dos “nossos” e dos “deles”, bastante parecido com o paradigma marxista da luta de classes, os signatários cometeram vários pecados mortais, e ficaram do “lado errado”. É com eles que estou e é com eles que quero estar, não tendo assinado o manifesto apenas por incúria minha em responder a tempo ao convite que me foi feito. Mas é como se o tivesse assinado, por isso incluam-me na lista dos insultos, que já estou habituado.
Veio ao de cima tudo, a começar pelo primeiro-ministro, que os tratou de essa “gente”, ou porque tinham uma “agenda política” ou porque eram “cépticos” por natureza, inúteis para o glorioso esforço nacional de empobrecer como programa de vida. O manifesto era “antipatriótico”, com um timing inaceitável, a dois meses da “libertação” de 1640, feito pelos “culpados” do esbanjamento, pelos “velhos” a defenderem os seus privilégios, pelos defensores do statu quo dos interesses instalados, pelos “jarretas”, pela “geração errada”. O seu objectivo escondido, ao assinarem o manifesto, é outro, é “manter o modelo de negócio que temos, o Estado que temos, e atirar a dívida para trás das costas”, escreve António Costa em editorial do Diário Económico. José Gomes Ferreira é mais claro: “Estará a vossa iniciativa relacionada com alguns cortes nas vossas generosas pensões?”
Os argumentos ad hominem abundam. Alguns dos signatários que são de direita, um bom exemplo é Adriano Moreira, passaram a ter que ser de esquerda, o que é um modo muito interessante de lhes recusar a identidade, esvaziá-los do que foram toda a vida, para substituir essa identidade por aquilo que é, na sua pena, um anátema: “Já cá faltava um manifesto, de espectro partidário amplo, mas com uma ideologia única, de Esquerda”, diz, de novo, um editorial de António Costa no Diário Económico.
Cada vez mais se generaliza em Portugal a idade como insulto, diminuição, culpa, e todos são “velhos” por associação. Falta-lhes a desenvoltura dos “jovens”. José Gomes Ferreira pergunta: “Que tal deixarem para a geração seguinte a tarefa de resolver os problemas gravíssimos que vocês lhes deixaram? É que as vossas propostas já não resolvem, só agravam os problemas. Que tal darem lugar aos mais novos?” De facto, troquem Manuela Ferreira Leite, Bagão Félix, Vítor Martins, Sevinate Pinto, o presidente da CIP, Capucho, Sampaio da Nóvoa, Braga da Cruz, Gomes Canotilho, Manuel Porto, Teresa Beleza, e tantos outros, pelos “mais novos”, Relvas, Arnault, Marco António, Passos, pelos yuppies das consultoras financeiras que antes vendiam os swaps, e agora iam negociá-los para o Governo, pelos jovens lobos dos escritórios de advogados que fazem todos os negócios do Estado e vice-versa, sob a batuta de alguns velhos “que estão lá sempre”, pelo jovem que era para ser propagandista do Impulso Jovem, pelos gestores desempoeirados que usam o Twitter todas as horas e que circulam de cargos políticos para a Caixa, para a RTP, para Angola, dos ministérios para as empresas do PSI-20, ou aqueles que os chineses empregam para manter um link, útil, mesmo que caro. Manuela Ferreira Leite é “velha”, Catroga é novo. “Que tal darem lugar aos mais novos?”
Nos comentários dos blogues pró-governamentais, ou seja, no fim da cadeia alimentar, espuma-se de ódio junto com erros de ortografia, alguns dos quais eu corrijo para se perceber, outros ficaram: “Este tipo de "notáveis" (…) sinceramente mentem nojo. Concordo em pleno com o nosso primeiro-ministro com o facto de hoje em dia já nem sequer consegue responder a este tipo de escumalha que hoje em dia aparece na comunicação social, parlamento em fim....por todo lado”; “foi uma ideia idiota que passou pela cabeça de alguns”; “infelizmente estamos já habituados a que figuras da direita se mudem para a ideologia da esquerda irresponsável vá-se lá saber a troco de quê, ou talvez fácilmente se saiba...(…) São gente golpista, que facilmente vende a alma e a dignidade.” E estes são alguns comentários reproduzíveis, a maioria é puro insulto soez.
A imprensa económica teve nesta fronda contra o manifesto um papel central, enfileirou editoriais furiosos e notícias com títulos críticos sobre como o manifesto de nada valia e como felizmente ninguém ouvia estes “irresponsáveis”, repetindo os argumentos do antipatriotismo, do “timingerrado” que sairia “caro” ao país, caso alguém “ligasse” ao manifesto, que deitaria abaixo o adquirido pelos “sacrifícios” dos portugueses, como disse o primeiro-ministro e eles glosam. José Gomes Ferreira vai mais longe – se as coisas correrem mal, a culpa é vossa: “Mesmo sendo uma proposta feita por cidadãos livres e independentes, pela sua projecção social poderá ter impacto externo e levar a uma degradação da percepção dos investidores, pela qual vos devemos responsabilizar desde já. Se isso acontecer, digo-vos que como cidadão contribuinte vou exigir publicamente que reparem o dano causado ao Estado.” A mensagem essencial é “saiam da frente”, a mesma que está na capa e no título de um livro de Camilo Lourenço, que achava bem que houvesse um novo resgate porque isso “disciplinaria” os preguiçosos dos portugueses.
O que é que tocou esta corda hipersensível de governantes, jornalistas da imprensa económica, homens da banca, alguns empresários e os seus agentes na ideologia “orgânica” do “ajustamento”? Primeiro, voltar ao bom senso e deixar os revolucionarismos de “mudar Portugal”, mostrar que há uma política alternativa, que pode ser difícil, mas é muito mais realista do que a política actual, ou seja, que há alternativas. E, pelo caminho, revelar a grande hipocrisia em que assenta a política governamental, e em nome da qual os portugueses têm vindo a ter a vida estragada: é que para se pagar a dívida, tem que haver folga para o crescimento económico e qualquer outra solução é pura e simplesmente irrealista. A questão é que daqui a uns anos, quando tudo isto desabar, nenhum destes corifeus políticos dos “mercados” vai estar por cá, mas a sua herança estará.
Segundo, que essa alternativa implica uma nova forma de estar na Europa, ou seja, responsabiliza-nos pela acção e não pela submissão. É como num velho ditado gaullista sobre os comunistas: “Só fazem aquilo que lhes permitimos que façam”. E como nós permitimos tudo, fazem tudo. Na Europa é-se mais realista, incluindo nos “mercados”, do que se pensa e seja porque nós actuamos, ou seja a reboque do que pode acontecer na França, Itália ou Espanha, a política vai mudar. Só que, quando mais tarde Portugal o reclamar como membro de parte inteira da União, mais estragado estará o país, maior será o preço.
Terceiro, o manifesto revela que o único consenso transversal existente hoje na vida pública portuguesa, é exactamente aquele que põe em causa a actual política do Governo e dos seus apoiantes. O outro “consenso” assenta num rotativismo entre PS e PSD, obrigados a um pacto que impõe uma política “única” e a aceitação e institucionalização de um colaboracionismo face a uma Europa que pode aceitar “manter-nos”, mas com rédea curta e disciplinados. É apenas a blindagem da actual política em eleições, para que, quer se vote no PSD ou no PS, tudo continue na mesma. Esse seria um enorme risco para a democracia.
Este surto de raiva, com laivos claramente censórios, não me surpreende. Estava à espera dele, na sua magnitude e violência. E não vai acabar, vai-se tornar endémico. Ele é o efeito a curto prazo de uma política que se assume para vinte ou trinta anos de empobrecimento, centrados num único eixo: pagar aos credores, obedecer aos mercados. Essa política não pode ser conduzida em democracia, só pode existir com base num regime autoritário.
(No PÚBLICO de 15 de Março de 2014. José Pacheco Pereira é historiador)
ABRA OS OLHOS E COMBATA O GOVERNO!
Sabias que…
ABRA OS OLHOS E COMBATA ESTE GOVERNO
- 76% dos prejuízos das empresas de transportes públicos deve-se ao pagamento de juros aos bancos?
- Dois terços dos passageiros da Carris têm mais de 65 anos?
- O total de juros pagos pelas empresas é 153% o valor dos salários?
- A CP e o Metro pagam mais em juros do que em salários, incluindo encargos com a Segurança Social?
- Despediram-se 37% dos trabalhadores entre 2001 e 2011?
- O Metro Sul do Tejo (privado) recebe 4 vezes mais indemnizações por cada passageiro do que o Metro de Lisboa (público)?
- A Fertagus (comboios privados) recebe 1,5 vezes mais indemnizações do que a CP?
- Que não há nenhuma empresa de transportes públicos na Europa que dê lucro?
- Até nos EUA a empresas de transporte ferroviário é pública?
- Foram eliminados 900 km de linhas ferroviárias desde 1988 e estão em curso planos para acabar com mais 430 km?
- Em 1988 realizaram-se 231 milhões de viagens de comboio em Portugal e em 2011 apenas 128 milhões?
- Portugal vais gastar 42.395.604.000 euros (42,4 mil milhões de euros) em 16 PPP de estradas até 2050, 2,5 vezes o total da dívida das empresas de transportes públicos acumulada ao longo de décadas?
- O transporte público tem efeitos positivos no ambiente, na saúde, na mobilidade, na poluição sonora e no trânsito?
- O secretário de Estado das Obras Públicas, Transportes e Comunicações foi assessor da Mota-Engil no polémico caso do Terminal de Contentores de Alcântara, contra o Estado?
A NÃO VIOLÊNCIA DE GANDHI... SERÁ QUE ISSO HOJE RESULTA?
~
CONTA-SE AINDA QUE
Quando Gandhi estudava Direito no Colégio Universitário de Londres, um professor de apelido Peters tinha-lhe aversão, mas o estudante nunca baixou a cabeça perante as frequentes provocações.
Um dia o Professor Peters estava a almoçar na sala de refeições da Universidade e o aluno vem com a bandeja e senta-se ao lado do professor.
O Professor, altivo, diz
- "Sr. Gandhi você não entende ... Um porco e um pássaro, não se sentam
juntos para comer."
Ao que Gandhi respondeu:
- "Fique o professor tranquilo ... Eu vou voando", e mudou-se pra outra mesa
Mr. Peters ficou cheio de raiva e decidiu vingar-se no teste seguinte, mas o
aluno respondeu de forma brilhante a cada pergunta. Então o professor fez
mais uma pergunta:
- "Mr. Gandhi, você está a andar na rua e encontra um saco, dentro dele está
a sabedoria e uma grande quantidade de dinheiro, qual dos dois tira?"
Gandhi responde sem hesitar: - "É claro professor que tiro o dinheiro!"
O professor Peters sorrindo diz: - "Eu, ao contrário, tinha agarrado a
sabedoria, você não acha?"
- "Cada um tira o que não tem, responde o aluno "
O professor Peters, fica histérico e escreve na folha do teste: Idiota!
E o jovem Gandhi recebe a folha e lê atentamente.
Depois de ler, dirige-se ao professor e diz:
O Professor, altivo, diz
- "Sr. Gandhi você não entende ... Um porco e um pássaro, não se sentam
juntos para comer."
Ao que Gandhi respondeu:
- "Fique o professor tranquilo ... Eu vou voando", e mudou-se pra outra mesa
Mr. Peters ficou cheio de raiva e decidiu vingar-se no teste seguinte, mas o
aluno respondeu de forma brilhante a cada pergunta. Então o professor fez
mais uma pergunta:
- "Mr. Gandhi, você está a andar na rua e encontra um saco, dentro dele está
a sabedoria e uma grande quantidade de dinheiro, qual dos dois tira?"
Gandhi responde sem hesitar: - "É claro professor que tiro o dinheiro!"
O professor Peters sorrindo diz: - "Eu, ao contrário, tinha agarrado a
sabedoria, você não acha?"
- "Cada um tira o que não tem, responde o aluno "
O professor Peters, fica histérico e escreve na folha do teste: Idiota!
E o jovem Gandhi recebe a folha e lê atentamente.
Depois de ler, dirige-se ao professor e diz:
- "Mr. Peters, reparo que assinou a minha folha, mas não colocou a nota".
É preciso saber reagir com serenidade e perspicácia às ofensas que se recebe?
É preciso saber reagir com serenidade e perspicácia às ofensas que se recebe?